Karin Lagdaf, representante da Frente Polisário no
Brasil, destaca papel da solidariedade e denuncia emirado do Marrocos por
anexação e repressão.
Leonardo
Wexell Severo
O emirado do Marrocos mantém ocupado, de forma
ilegal e criminosa, desde 1975, a República Árabe Saarauí Democrática (RASD).
Nesta entrevista, o dirigente Karin Lagdaf, representante da Frente Polisário,
que lidera a luta de libertação nacional desde o primeiro governo no exílio,
destaca a importância da mobilização pelo reconhecimento da RASD a partir do
crescente isolamento do emirado. O muro que segrega a República, a fim de
superexplorar as suas riquezas naturais - como o peixe e o fosfato -, é mantido
com 117 mil soldados e seis milhões de minas terrestres.
Veja o que diz o dirigente Karin Lagdaf, representante da Frente Polisário,
que lidera a luta de libertação nacional da República Árabe Saarauí.
Karin Lagdaf, |
Brasil de fato: Temos
acompanhado a intensa mobilização da Frente Polisário pelo reconhecimento da
República Árabe Saaraui Democrática. Qual é a situação atual desta luta pela
independência do Marrocos?
Karin Lagdaf: A situação está evoluindo bem,
não tão rápido quanto queríamos, mas há avanços claros na luta contra o
Marrocos, inclusive no seu próprio campo. Mesmo os governos dos Estados Unidos
e da França começaram a ter mais reservas e a serem menos agressivos
conosco, suspendendo programas e acordos, o que tem debilitado a ocupação marroquina
e a sustentação desta violação no campo internacional.
Brasil de fato: Como
o emirado do Marrocos tem reagido?
Karin Lagdaf: A
desgraça continua. A repressão dentro dos territórios ocupados não diminuiu em
nenhum momento. No dia 17 de abril veio um novo informe da Organização das
Nações Unidas e, agora, finalmente, acredito que teremos uma missão da ONU
específica para a questão dos direitos humanos em nosso país. Causa estranheza
que não haja vigilância alguma para uma questão tão grave como são as
reincidentes violações praticadas pelas tropas marroquinas. Acho que esta nova
correlação, mais favorável, se deve ao fato de que o Marrocos não é mais membro
do Conselho de Segurança da ONU.
Brasil de fato: Como
este crescente e amplo leque de apoios para a causa independentista tem
repercutido?
Karin Lagdaf: No plano africano temos ampliado
e fortalecido apoios em todos os níveis, desde a direção da União de Sindicatos
da África até a vice-presidência do parlamento africano. O governo do Marrocos
com sua decisão de não reconhecer que a França domina o Senegal e o Camarões está
se isolando cada vez mais. Todas as universidades da Espanha realizaram atos de
solidariedade à luta saarauí. Da mesma forma como ocorreram inúmeros protestos
na Europa contra a presença de bases estadunidenses no Iraque, cresce o apoio
contra a presença do Marrocos em nosso território.
Brasil de fato: De
que forma o agravamento da crise interna no Marrocos tem impactado a sua
capacidade de agressão ao povo saarauí?
Karin Lagdaf: O governo do Marrocos está com
uma dívida externa de US$ 40 bilhões, o equivalente a mais de 127% do seu PIB e
não tem como pagar. No ano passado isso se refletiu em menos recursos do
emirado para o ensino e para a saúde, o que gerou e continua gerando maior
descontentamento interno.
Brasil de fato: Estamos
frente a um globo que traz nitidamente a República Saarauí com um território
demarcado, é um país reconhecido por grande parte da comunidade
internacional. No entanto há problemas diplomáticos justamente na
nossa região...
Karin Lagdaf: No Paraguai, sob a presidência de Fernando Lugo,
íamos inclusive abrir uma embaixada, mas as relações retrocederam. Na América
Latina, fora o Brasil, a Argentina e o Chile, todos os países, sem exceção,
reconhecem a República Saarauí como um país de fato e de direito. No Brasil,
deputados e senadores já aprovaram o reconhecimento por unanimidade, na Câmara
e no Senado. Infelizmente, até agora o governo ainda não formalizou esta
decisão tão importante. Temos conversado com importantes amigos, no
nível mais alto do Itamaraty, e estamos otimistas, mas ainda não há nada de
concreto. Como é o nosso povo que está sofrendo com a ocupação, temos pressa.
Brasil de fato: Fale
um pouco mais sobre a ocupação.
Karin Lagdaf: Temos um muro que nos divide, onde estão alocados
117 mil soldados marroquinos e seis milhões de minas terrestres. Há uma
separação entre a parte ocupada com a parte liberada, equivalente a 32% do
território. O Marrocos explora nossas riquezas naturais enquanto mantém
centenas de milhares de saarauís à margem. Quem luta é condenado com penas de
25 a 30 anos pelo governo marroquino, quando não é submetido à prisão perpétua. Como
estamos falando com brasileiros, é bom lembrar que utilizam companhias do Rio
de Janeiro para trazer peixes e industrializar no Brasil, vendendo fosfato e
importando remédio, pólvora e pesticida. É como se fôssemos a última colônia na
África.
22/04/2014