Pesquisar este blog

sábado, 26 de maio de 2012

Estamos tentando recuperar nossa PRÓPRIA VOZ

Estamos tentando recuperar nossa PRÓPRIA VOZ

Como pode ser observado na publicação passada, “Outono Austral”, destacamos uma série de eventos históricos que aconteceram no mês de maio, que poderia ser trabalhado em sala de aula sem nenhum prejuízo aos assuntos que comumente aparece nos manuais escolares, além de um estudo das obras de Eduardo Galeano e Gabriel García Márques. Com efeito, esse material já seria suficiente para o período de maio; e assim sendo, teríamos cumprido a nossa missão com o nosso alunado. Mas, minha intuição aliada à inquietação e incompletude humana, me dizia que ainda estava faltando alguma coisa para fechamos este mês com “chave de ouro”, como diz o adágio popular. Deste modo, revirando o meu baú encontrei um importante decreto federal:

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso II, da Constituição,
                                                                                          
DECRETA:
Art. 1º Fica instituído o Dia Nacional do Cigano, a ser comemorado no dia 24 de maio de cada ano.       

Art. 2º As Secretarias Especiais de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos da Presidência da República apoiarão as medidas a serem adotadas para comemoração do Dia Nacional do Cigano.

Art. 3º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 25 de maio de 2006; 185o da Independência e 118o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Dilma Rousseff

Publicado no D.O.U. de 26.5.2006
 
 

Porém, o referido decreto faz uma merecida e justa homenagem às minorias étnicas, especificamente, os ciganos que muito contribuíram culturalmente para a construção da nossa pátria. Embora hoje, exista apenas um grupo muito pequeno de ciganos que habitam o espaço territorial brasileiro resistindo e mantendo viva a sua cultura milenar, isto não tira a sua importância ou inserção nas políticas públicas que assiste as minorias étnicas do país. No entanto, a própria Constituição Federal de 1988 apontam artigos que, por extensão, engloba o respeito e os direitos das minorias étnicas. A partir deste decreto federal, fica estabelecido no nosso calendário que no dia 24 de maio é comemorado o Dia Nacional do Cigano. Ou seja, o Dia da Consciência Cigana. Além deste importante decreto federal  encontramos também uma preciosa entrevista intitulada “Estamos tentando recuperar nossa PRÓPPRIA VOZ” do escritor Eduardo Galeano, concedida à jornalista Fania Rodrigues da Revista Caros Amigos em 2009. Estampei um sorriso de orelha a orelha no rosto; pois, temporariamente minha busca chegara ao fim. Contudo, um decreto federal em prol dos menos favorecidos e essa entrevista do Galeano ao nosso entender contribuem para a formação humanística e crítica dos alunos, e, sobretudo, a construção de uma identidade que os levem a romper com a história postulada pelos donatários do poder, reinventando-a e reescrevendo-a. Eis abaixo, a entrevista na íntegra: 

 
“Um do mais respeitados escritores e intelectuais da América Latina, Eduardo Hughes Galeano recebeu a Caros Amigos numa tarde de segunda-feira, no Café Brasilero, em Montevidéu. Aos 69 anos fala, em fluente português, sobre sua literatura, o amor pelos cafés e, claro, sobre política. Uruguaio de nascimento (1940), latino-americano por devoção e cidadão do mundo por paixão, quando criança, sonhava em ser jogador de futebol. ‘Era uma maravilha jogando, mas só de noite, enquanto dormia’. Melhor assim. Os campos de futebol não perderam nada, porém a literatura ganhou um verdadeiro artesão das palavras. Suas obras combinam elementos de literatura, sensibilidade e observação jornalística, que estão sempre em função de paixões. Autor de mais de trinta livros, dezenas de crônicas e artigos, Galeano também é um exímio defensor do socialismo, dos direitos e da dignidade humana. Entre seus livros, pode se destacar As Veias Abertas da América Latina, a trilogia Memória do Fogo, Livro dos Abraços e o último, Espelhos- uma história quase universal, lançado em 2008, em que o autor reescreve, a partir de um outro ponto de vista, episódios que a história oficial camuflou.Galeano ‘remexe no lixão da história mundial’ para dar voz aos ‘náufragos e humilhados’”.

Caros Amigos - Você nasceu em Montevidéu? Gostaria que falasse um pouco da sua infância?

Eduardo Galeano Sim, nasci em Montevidéu. Minha Infância? Eu nem lembro já faz tanto tempo... Mas acho que foi bastante livre. Eu morava em um bairro quase no limite da Montevidéu, onde havia grandes edifícios. Então tinha espaço verde. Sinto pena das coitadas das criancinhas que vejo agora, prisioneiras na varanda de casa. Meninos ricos são tratados como se fossem dinheiro, meninos pobres são tratados como se fossem lixo. Muitos, pobres e ricos viram prisioneiros, atados aos computadores, à televisão ou alguma outra máquina. Mas eu tive uma infância muito livre. Fiz a escola primária, secundária, depois comecei a trabalhar por minha conta. Então, com 15 anos, já era completamente livre.                

Caros Amigos - Em que trabalhou?

Eduardo Galeano Fiz de tudo o que você possa imaginar. Fui desenhista (adoro desenhar até hoje), taquígrafo, mensageiro, funcionário de banco, trabalhei em agência de publicidade, colaborador... Fiz milhares de coisas, mas, sobretudo, comecei a aprender o ofício de contar história. Eu era um cuenta cuentos (conta contos). E aprendi a fazer isso nos cafés, como esse onde a gente está agora falando, que leva o honroso nome de brasilero.

Caros Amigos - O mais tradicional dos cafés uruguaios se chama brasilero?

Eduardo Galeano - E esse é o último sobrevivente, o último dos moicanos dos cafés nos quais eu fui formado. Minha universidade foram os cafés de Montevidéu, foi aqui que aprendi a arte de narrar, a arte de contar histórias.

Caros Amigos - Conversando com pessoas?

Eduardo Galeano - Escutando. Conversando sim, mas aprendi muito mais escutando. Desde muito menino aprendi que, por alguma razão, nascemos com dois ouvidos e uma única boca. Mas esses cafés típicos de Montevidéu pertenciam a uma época que não existem mais. Pertenciam a um tempo no qual havia tempo para perder tempo.

Caros Amigos - Como foi  sair do Uruguai, na época da ditadura (1973-1984)?

Eduardo Galeano - Quando a ditadura se instalou, eu corri para a Argentina, em 1973. Lá fundei uma revista cultural chamada Crisis. Depois fui obrigado a voar de novo. Não podia voltar para o Uruguai, porque não queria ficar preso, e fui obrigado a sair da Argentina porque não queria ser morto. A morte é uma coisa muito chata. Então fiquei na Argentina até o final de 1976, quando se instala a ditadura Argentina. Aí fui para a Espanha, onde fiquei até o final da de 1985. Depois disso voltei ao Uruguai. No começo, minha situação em Barcelona foi muito complicada. Eu não tinha documentos, pois a ditadura uruguaia se recusava a fornecer. O que possuía era um documento de salvo conduta das Nações Unidas, que não servia para muita coisa. Eu tinha que ir todo mês à polícia renovar o meu visto de permanência e passava o dia inteiro preenchendo formulários de perguntas. Então, um dia, onde dizia profissão, coloquei escritor, entre aspas, de formulários. Mas ninguém percebeu. A polícia achou normal ser escritor de formulários!

Caros Amigos - Havia duas listas das ditaduras do Cone Sul. Uma, com os nomes das pessoas que estavam marcadas para morrer e outra para a extradição. Em qual você estava?

Eduardo Galeano - Nas duas

Caros Amigos - Na época da ditadura, muitas pessoas, assim como você, ficaram sem documentos, não podiam sair do país e foram mortas a tiro ou envenenadas?

Eduardo Galeano – Eu tive sorte. Não me lembro de ter sido envenenado, nem mesmo pelos críticos literários. Claro que sofri muitas ameaças, mas não vou fazer aqui uma apologia do mártir, do herói da revolução. Mas claro que a vida não era fácil, sobretudo por que a situação dessa revista que fundei na Argentina era difícil, pois chegava muito além das fronteiras tradicionais das revistas culturais. Nós vendíamos entre 30 e 35 mil exemplares. Isso, para uma revista cultural, era uma prova de resistência. Nós pensávamos em fazer era um resgate das mil e uma formas de expressão da sociedade. Não apenas dos profissionais da cultura, mas também das cartas dos presos, cultura contada pelos operários das fábricas, que raramente viam a luz o sol. Esse tipo de coisa que para nós também era cultura.

Caros Amigos - O livro As Veias Abertas da América Latina foi escrito na década de 1970. Hoje, é possível escrever um novo As Veias Abertas?

Eduardo Galeano – Para mim esse livro foi um ponto de partida, não de chegada. Foi o começo de algo, de muitos anos de vida literárias e jornalística tentando redescobrir realidade, tentando ver o não visto e contar o não contado. Depois de Veias escrevi muitos livros que foram continuações, de um certo modo, e uma tentativa de cavar, cada vez mais profundamente, a realidade.Isso com o objeto de ampliar um pouco as ideias, porque Veias é um livro limitado à economia política latino-americana. Os livros seguintes tem que ser lidos com a vida toda, nas suas múltiplas expressões, sem dar muita bola nem ao mapa, nem ao tempo. Se eu fico apaixonado por uma história, me ponho a contar histórias de qualquer lugar do mundo e de qualquer tempo. Conto a história da história, que podem ter acontecido há 2 mil anos e tento escrever de tal modo que aconteçam de novo, na hora em que são contadas. Aí está o verdadeiro ofício de contar, que aprendi nos cafés de Montevidéu, que inclusive permite a você escutar o som das patas dos cavalos, sentir o cheiro da chuva...

Caros Amigos - Pode-se dizer que hoje existe uma demanda por governos de esquerda na América Latina? Em sua opinião, esses governos têm contribuído para diminuir a pobreza e a desigualdade social nesses países?

Eduardo Galeano – O que existe é um panorama muito complexo e diverso de realidades diferentes. Também vemos respostas sociais e políticas diversas. Isso é o que nossa região do mundo tem de melhor: sua diversidade. Esse encontro de cores, de dores tão diferentes, é a nossa riqueza maior. Os novos movimentos, como esses, que estão brotando por toda parte, que tentam oferecer uma resposta diferente às desigualdades sociais, contra os maus costumes da humilhação e o fatalismo tradicional, também são respostas diversas porque expressam realidades diferentes. Não se pode generalizar. O que existe sim é uma energia de mudança. Uma energia popular que gera diversas realidades, não só políticas, mas realidades de todo tipo, tentando encontrar respostas, depois de vários séculos de experiências não muito brilhantes em matéria de independência. Agora estamos comemorando, em quase todos os países, o bicentenário de uma independência que ainda é uma tarefa por fazer.

Caros Amigos - O que falta para a América Latina ser completamente independente?

Eduardo Galeano - Romper com o velho hábito da obediência. Em vez de obedecer à história, inventá-la. Ser capaz de imaginar o futuro e não simplesmente aceitá-lo. Para isso é preciso revoltar-se contra a horrenda herança imperial, romper com essa cultura de impotência que diz que você é incapaz de fazer, por isso tem que comprar feito, que diz que você é incapaz de mudar, que aquele que nasceu como nasceu vai morrer. Porque dessa forma na temos nenhuma possibilidade de inventar a vida. A cultura da impotência te ensina a não vencer com sua própria cabeça, a não caminhar com suas próprias pernas e a não sentir com seu próprio coração. Eu penso que é imprescindível vencer isso para poder gerar uma nova realidade.

Caros Amigos - A América latina copiou um modelo de desenvolvimento que não foi feito para ela. É possível inventar um modelo próprio de desenvolvimento?

Eduardo Galeano – Não vou entrar em detalhes porque se fosse falar da quantidade de cópias erradas seria uma lista infinita. O desafio é pensar no que queremos ser: originais ou cópias? Uma voz ou eco? Agora estamos tentando recuperar nossa própria voz, em diferentes países, de diversas maneiras.

Caros Amigos- A implantação das bases dos Estados Unidos na Colômbia fere a dignidade do povo latino-americano e compromete a independência e a liberdade do Sul?

Eduardo Galeano – Sim. É a continuação de uma tradição humilhante. Também há perigo da intervenção direta dos Estados Unidos nos países latino-americanos. Meu mestre, Ambroce Bierce, um escritor norte-americano maravilhoso, quando se iniciou a expansão imperial dos Estados Unidos, no século 19, dizia que a guerra é um presente divino enviada por Deus para ensinar geografia. Por que assim eles (estadunidenses) aprendiam geografia. E é verdade. Os EUA têm uma tradição de invadir países sem saber onde estão localizados e como são esses países. Tenho até a suspeita de que (George W.) Bush achasse que as Escrituras tinham sido inventadas no Texas e não no Iraque, país que ele exterminou. Então, esse perigo militar latente é muito concreto. Atualmente, os EUA possuem 850 bases militares em quarenta países. A metade do gasto militar mundial corresponde aos gastos de guerras dos EUA. Esse é um país em que o orçamento militar se chama orçamento de defesa por motivos, para mim, misteriosos e inexplicáveis. Porque a última invasão sofrida pelos EUA foi em 1812 e já faz quase dois séculos. O mistério se chama de defesa, mas é de guerra, mas como que se chama de defesa? O que tem a ver com a defesa? A mesma coisa se aplica às bases na Colômbia, que também são “defensivas”. Todas as guerras dizem ser “defensivas”. Nenhuma guerra tem honestidade de dizer “eu mato para roubar”. Nenhuma, na história da humanidade. Hitler invadiu a Polônia porque, segundo ele, a Polônia iria invadir a Alemanha. Os pretextos invocados para a instalação dessa base dos EUA na Colômbia não são só ofensivas contra a dignidade nacional dos nossos países, como também ofensivas contra a inteligência humana. Por Que dizer que serão colocadas lá para combater o tráfico de drogas e o terrorismo? Tráfico de drogas, muito bem... 80% da heroína que se consome no mundo inteiro vêm do Afeganistão. 80%! Afeganistão é um país ocupado pelos EUA. Segundo a legislação internacional, os países ocupantes têm a responsabilidade sobre o que acontece nos países ocupados. Se os EUA têm interesse de verdade de lutar contra o narcotráfico, tem que começar pela própria casa, não pela Colômbia e sim pelo Afeganistão, que faz parte da sua estrutura de poder, e que é o grande abastecedor de heroína, a pior das drogas. Outro pretexto invocado é o terrorismo. Mas não é sério. Não é sério, por favor. A grande fábrica do terrorismo é essa potência mundial que invade países, gera desespero, ódio, angústia. Sabe quem esteve sessenta anos na lista oficial dos terroristas dos EUA? Nelson Mandela, Prêmio Nobel, presidente da África do Sul. Cada vez que viajava aos EUA, ele precisa de um visto especial do presidente dos Estados Unidos, porque era considerado um terrorista perigoso durante sessenta anos. Até 2008. É desse terrorismo que estão falando? Imagina se eu fosse incorporado agora na lista dos terroristas dos EUA e tivesse que esperar sessenta anos para ser tirado. Acho que daqui a sessenta anos vou estar um poquitito mortito.

Caros Amigos - Você acredita que o Brasil também exerce um imperialismo sobre os países da América do Sul?

Eduardo Galeano – Não. Não é só a situação do Brasil, mas de países que são grandes e poderosos em relação a outros que são menores e mais fracos. Porque a cadeia de opressão nunca tem apenas dois elos. Na história, nunca existiu apenas um opressor e apenas um oprimido. Uma classe social opressora é uma classe oprimida. Não. Os elos são múltiplos e muito diversos. A situação do Brasil não tem nada de excepcional. A relação do Brasil com o Paraguai, por exemplo, começa agora ser mais respeitosa. A partir das presidências do Lula e do Lugo. Mas evidentemente que antes não eram nada igualitárias. Com a Bolívia tampouco. Mas isso é como na sociedade: o presidente da empresa dita ordens para o diretor, que dita ordens ao gerente, que repassa para o chefe de sessão, que ordena ao operário, que dita ordens à mulher, que manda no menino, que chuta o cachorro.

Caros Amigos - O socialismo ainda é possível?

Eduardo Galeano A palavra socialismo foi muito desprestigiada, devido à utilização errada do termo ao longo do século 20. Foi usada para maquiar o capitalismo ou para justificar um poder burocrático que tratava o povo como se fosse menor de idade. Então, houve um grande desprestígio da palavra. Foi utilizada como social - democracia pelos governos comunistas em tais termos que hoje é difícil recuperá-la.O importante é ajudar o nascimento, o parto, desse mundo cansado que está grávido de outro, para que outro mundo novo possa nascer. Tenha o nome que tenha. Não sei se vai ser chamado de socialismo, mas tem que ser, sim, solidário num sentido comunitário, e, sobretudo, tem que ser um mundo capaz de resgatar a melhor das tradições americanas: a comunhão com a natureza. É a tradição indígena mais velha e mais importante de todas: resgatar a certeza de que somos parte da natureza e de todo crime executado contra a natureza se converte em suicídio, porque acaba sendo um tiro no pé da condição e do gênero humano. Uma coisa me espantou muito foi quando li nos jornais há poucos dias, que o Brasil é o número um no ranking dos países consumidores de agrotóxicos, ou seja, é o país que mais consome venenos químicos na agricultura no mundo. Espero que a informação seja errada, pois isso seria muito grave. Espero que meus amigos brasileiros me digam que não é assim para o meu consolo. Porque é um país que eu amo. Como isso é possível? Às vezes as boas notícias não vêm apenas dos países que ocupam os maiores espaços nos jornais no mundo. Como, por exemplo, o Equador. Mas esse é um país que há pouco tempo, pela primeira vez na história da humanidade, incorporou à sua Constituição uma disposição estabelecendo os direitos da natureza. A natureza como sujeito de direito. É a primeira vez que isto acontece. Acho que é um passo muito importante nesse mundo, que está avançando rapidamente para o extermínio do ar, da terra e das águas. Seria importante que esse país pequeno, do qual se fala pouco, fosse imitado pelos países grandes. A natureza tem direitos e esses direitos são sagrados.

Caros Amigos - Qual sua opinião sobre a implantação da planta e Botnia (empresa de celulose) no Uruguai?

Eduardo Galeano – A Botnia já está funcionando faz tempo. Prometeu milhões de empregos e depois foram poucos. A causa que acho legítima da defesa do meio ambiente pode não ser muito popular, porque existe uma expectativa de geração de emprego que faz com que muitos desesperados, muita gente em condição difícil aceite esse pão, mesmo que implique fome para amanhã. Pan para hoy, hambre para mañama. (Pão para hoje, fome para amanhã). Por isso, a causa ecológica não é muito popular. O que acho é  que o Uruguai é um país muito pequeno e não tem costas para aguentar várias empresas, como essa, de fabricação de celulose. Porque Botnia é a primeira, depois vem o segundo projeto, o terceiro, o quarto... Tínhamos seis projetos como esse. Agora, com a crise a coisa mudou, para nossa sorte. Afortunadamente parece que a coisa está mudando. Alguns desses gigantes estão apreensivos e não vão fazer os investimentos que tinham prometido. Mas as condições que o Uruguai ofereceu eram as melhores: subsídios, nada de impostos, aceitação passiva da destruição da terra, o ressecamento geral das águas e poluição do ar.

Caros Amigos - A crise econômica mundial provocou uma reflexão sobre o sistema capitalista e sobre nossa cultura consumista?

Eduardo Galeano – Não sabemos o que vai acontecer, porque a crise ainda não passou. Não se trata de um mau momento. Está sendo um problema gravíssimo no mundo inteiro e que no meu entender mostrou mais uma vez a liberdade do dinheiro e a prisão das pessoas. Ficamos todos prisioneiros da loucura e do delírio especulativo das altas finanças, que hoje mandam no mundo capitalista muito mais do que as forças produtivas. Isto gerou a necessidade do Estado intervir na economia dos países ricos. Mas o que aconteceu nesses países onde o Estado foi aniquilado em nome da liberdade do mercado? A religião do mercado aniquilou o Estado, ou pelo menos fez o possível para reduzi-lo à triste função de carrasco e de carcereiro. É preciso recuperar os super poderes do Estado em nome do poder público, porque só ele é capaz de controlar essas forças diabólicas do mercado livre. O livre comércio tem refluxo das pressões, que tem uma história tristíssima. Foi em nome do livre comércio que o Paraguai foi aniquilado no século 19. Foi em nome do livre comércio que a China foi obrigada a consumir ópio. A rainha da Vitória (da Inglaterra) era narcotraficante. E foi em nome do livre comércio que a indústria têxtil da Índia foi exterminada. Ou seja, o livre comércio tem uma história horrível e está claríssimo que se os EUA tivessem aplicado o livre comércio logo após sua independência continuariam sendo colônia da Inglaterra. Portanto, essa identificação da liberdade do dinheiro com a liberdade das pessoas é mentirosa e inimiga da liberdade humana.

 Caros Amigos - Agora vamos falara um pouco de literatura e sua rotina de trabalho. Você ainda escreve todos os dias?

Eduardo Galeano – Não. Eu só escrevo quando minha mão coça. Aprendi isso com um velho negro que tocava tambor como Deus. Vê-se que Deus toca tambor... Bem, ou pelo menos como o diabo deveria tocar. Então perguntei a ele: “como você faz para tocar tambor assim?” E ele me respondeu: “eu toco quando a minha mão coça, quando a mão pica.” Eu também escrevo quando sinto necessidade de contar algo, alguma história que está crescendo dentro de mim e que quer se oferecer aos demais.  

Caros Amigos - Qual sua obra-prima? Você já escreveu ou ainda está por vir?

Eduardo Galeano – O melhor dos meus livros é o livro que ainda não escrevi. O mais intenso e alegre dos meus dias é aquele que ainda não vivi. O Espelhos é o mais audaz, no sentido de que é um livro sem fronteiras. Nele, conto histórias que acontecem em todas as partes em todos os tempos, tentando ver as coisas do ponto de vista dos náufragos dessa longa viagem através dos séculos do gênero humano no mundo. Dos náufragos que não estão na história oficial. Como as mulheres, por exemplo.

Caros Amigos - E por que Espelhos?

Eduardo Galeano - Tenho a esperança de que quem leia possa sentir que ele está também aí dentro (do livro), que tem um espelho que reflete a sua face. A ideia é que seja um livro de todos, de todas as caras que aparecem no espelho quando nos vemos. Cada pessoa é de alguma maneira, muito mais do que sabe que é. Nós temos um arco-íris terrestre para recuperar, que é de uma cor e uma alegria impressionante. É uma tarefa a fazer porque esses arco-íris terrestres são muito mais lindos, muito mais belos. Mas esse arco-íris está mutilado pelo machismo, pelo racismo, pelo militarismo e por muitos ismos a mais. Isso impede a felicidade de conhecer o tempo passado e de reconhecer que ele foi uma profecia do tempo presente. Não estamos condenados a repetir o passado, mas sim, somos obrigados a aprender com ele para não repeti-lo. A proposta de Espelhos, assim como a de todos os outros livros que escrevi, é ver as coisas a partir de outro ponto de vista. Se um verme vê um prato de espaguete vai achar que é uma orgia. Tudo depende de onde você se coloca. Para os países oprimidos, a história oficial não é a história verdadeira. Outro exemplo são vocês mulheres. A Revolução Francesa promoveu a declaração dos direitos dos homens e dos cidadãos, mas quando uma mulher chamada Olímpia de Gouges teve a coragem, e a loucura, de propor uma declaração dos direitos da mulher e da cidadã, a guilhotina cortou a sua cabeça. Então, o ponto de vista da mulher não pode ser o mesmo ponto de vista do homem. A mesma coisa acontece com os humilhados da terra, como os negros, por exemplo.

Enfim, mais uma contribuição deste cigano da educação para aqueles que sonham, lutam  e acreditam que um mundo melhor é possível. Ou talvez, uma provocação a aqueles que ousam desafiar e  humilhar os náufragos da América Latina a nossa pátria mãe.

Referências:
  • Caros Amigos. Revista Mensal. Ano XIII Nº 152. São Paulo: Casa Amarela. Nov, 2009.
  • http://www.jusbrasil.com.br/diarios/589298/dou-secao-1-26-05-2006-pg-4

quinta-feira, 10 de maio de 2012

OUTONO AUSTRAL


  

O mês de maio, período da estação do ano Outono. A estação que sucede ao verão e antecede o inverno. Porém, essa estação tem como peculiaridade o abaixamento das temperaturas médias, com exceção das regiões próximas a linha do equador, e também as árvores ficam amareladas e liberam suas folhas, indicando a mudança entre as estações do ano verão e inverno. “O Outono do hemisfério norte é chamado de ‘Outono boreal’, e o do hemisfério sul é chamado de ‘Outono austral’. O ‘Outono boreal’ tem início, no Hemisfério Norte, a 23 de setembro e termina a 21 de dezembro. O ‘Outono austral’ tem início, no Hemisfério Sul, a 21 de março e termina a 21 de junho”. Portanto, este mês é um libelo para as aulas de História que em tempos de informação instantânea e alta competitividade profissional, o professor não pode abrir mão de apresentar aos alunos o patrimônio cultural da humanidade.

Pois, o papel do professor é senão estabelecer uma articulação entre o patrimônio cultural da humanidade e o universo cultural do aluno. Assim sendo, neste mês de maio o professor tem um leque de possibilidades para trabalhar várias temáticas históricas que não aparecem comumente nos livros didáticos, e quem sabe utilizando essas alternativas o aluno (a) venha despertar o interesse pela disciplina. Deste modo, poderíamos afirmar que, neste mês fora assinado o tratado da Tríplice Aliança (1°de maio de 1865); instituído o Dia Mundial do Trabalho (1º de maio de 1890); Criação da Impressão Régia (13 de maio de 1808); Abolição da Escravatura (13 de maio de 1888); Dia das Mães (No Brasil fora oficializado em 1932, pelo então presidente Getúlio Vargas, sendo celebrado sempre no segundo domingo de maio).        

Além dessas possibilidades elencadas acima, gostaria de presentear também aos caros leitores e leitoras uma análise das obras: As Veias Abertas da América Latina de Eduardo Galeano e Cem Anos de Solidão de Gabriel García Márquez. Obras que pela nossa concepção mostram eventos transformadores ou por que não dizer des (cons) truidores na América Latina.       
As Veias Abertas da América Latina
Há muitos livros sobre a América Latina e sempre aparecem outros, reiterando elementos já explorados ou refazendo novas leituras de um continente que teve a sina de ser rico em todos os seus aspectos, e, sobretudo cobiçado e atraído pelos exploradores e ceifadores de vidas humanas (negros, indígenas, mulatos, cafuzos, mamelucos e os menos favorecidos). 

Mas sem dúvida, embora datado, este texto de Eduardo Hughes Galeano não é a melhor publicação feita a respeito deste continente, mais merece uma leitura por parte daqueles que tem interesse em compreender esse mosaico que chamamos América Latina.

Em primeiro lugar pela competente analogia que Eduardo Galeano faz das rapinagens e deslealdades cometidas neste continente pelos impérios europeus no período colonial e na contemporaneidade pelo império dos americanos do  norte. Em segundo pela linguagem simples e de fácil de compreensão. Neste sentido, apresento uma breve análise a respeito do livro do Escritor:

GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina, 41ª ed. São Paulo: Paz e Terra. 2002.
 
Eduardo Hughes Galeano nasceu aos 3 de setembro de 1940 em Montevidéu capital do Uruguai,  iniciou sua carreira jornalista no primeiro quartel de 1960 como editor de um influente jornal semanal chamado Marcha;  diga-se de passagem, esse jornal tinha como colaboradores de peso  escritores como Mario Vargas Llosa e Mario Benedetti.

Galeano fora também editor e editor- chefe dos respectivos jornais: Diário de Época e Jornal Universitário. Esse jornalista investigativo e militante ao longo de sua brilhante carreira trabalhou em diversas áreas: pintor de letreiros, mensageiro, datilógrafo, caixa de banco e chargista. Em 27 de junho 1973 quando o então presidente Juan María Bordaberry apoiado pelos militares fechou o Senado a e Câmara de deputados lançando o país numa ditadura civil-militar brutal e sangrenta proibindo os partidos políticos, colocando os sindicatos na ilegalidade e perseguindo, torturando e executando os seus opositores, Galeano fora preso e forçado a exila-se na Argentina.

Pois, durante esse período que Galeano esteve  exilado na Argentina lançou a revista cultural: Crisis. Três anos depois, um grupo de extermínio conhecido como esquadrões da morte liderado pelo então general Jorge Videla, enquadra o jornalista como persona non grata ao regime uruguaio; porém, Galeano temendo por sua segurança foge e exila-se na Espanha, voltando ao país somente em 1985 com a redemocratização do país.

Contudo, o grande marco no âmbito da literatura histórica desenvolvido por esse fabuloso jornalista sem sombra de dúvida fora o livro “As Veias Abertas da América Latina”, escrito em 1971. Embora seja um livro datado é uma obra que merece ser lida, pois haja vista que, o autor analisa de forma contundente espoliação do continente latino americano pontuando desde o período colonial até os idos da contemporaneidade, enfatizando a dilapidação e exploração econômica, social, cultural e política do povo latino-americano primeiro pelos intrépidos europeus depois pelos imperialistas da América do Norte. 

Além desta obra-prima, Galeano tem uma infinidade de livros, artigos e trabalhos publicados em periódicos do mundo inteiro, pode-se apreciar em nosso idioma também livros como: Vagamundo (1973); Días y noches de amor y de guerra (1978); Memória do fogo (1982-1986); O livro dos Abraços (1989); Las palabas andantes (1993); O futebol ao sol e à sombra (1995); Mulheres (1997); Patas arriba: la escuela del mundo al revés(1998); Bocas del Tiempo(2004); O Teatro do Bem e do Mal (2002); Espelhos - uma quase história universal (2008). 

Com “As veias abertas da América Latina”, a editora Paz e Terra oferece um livro que pretende ser um manual de cabeceira para todos aqueles que almejam apreender os fatores que culminaram com o subdesenvolvimento da América Latina.

Conhecido tanto no Brasil como no exterior Eduardo Galeano um jornalista de pesquisa, num período conturbado onde as ditaduras e as tiranias vilaniam a nação e abalavam de maneira vil o caráter latino-americano; alienando as novas gerações, tornando-as impossibilitadas de compreender a sociedade em que viviam; formidavelmente este uruguaio escreve a fantástica obra “As veias abertas da América Latina” denunciando “A exploração do homem pelo homem” e também a exploração da terra nos seus mais diversos setores (agrícola e mineral).

Galeano convicto politicamente despreza a imaginação romântica do continente e procura narrar fatos que tenham seus correspondentes na realidade exterior, evitando, portanto, situações que venham parecer artificiais ou improváveis.

Partindo deste pressuposto, concluiu-se que, o autor de “As veias abertas da América Latina” dividiu a obra em duas partes: “A pobreza do homem como resultado da riqueza da terra”, onde ele assinala que o continente latino-americano fora incorporado no sistema internacional de comércio e também de colonização nos meados do século XV pelos países da península ibérica (Portugal e Espanha) de uma maneira árdua e tirânica, condicionado pela força e com muito sangue. “O sangue da terra, que produzia tantos produtos tropicais e riquezas cobiçadas; o sangue de homens e mulheres, cujos corpos se dissolveram como fermento nos processos produtivos, fazendo crescer a civilização capitalista”.

Ademais, ilustrando cada vez mais a asserção mencionada, o próprio Galeano diz: “Do Potomac ao rio da prata, os escravos edificaram a casa de seus amos, abriram as matas, cortaram e moeram cana-de-açúcar, plantaram algodão, cultivaram o cacau, colheram o café e o tabaco, afogaram-se dos sovacãos mineiros”.

Porém, mais adiante ele conclui: “Os donos de terras, mineiros e mercadores tinham nascido para cumprir esta função: abastecer a Europa de ouro, prata e alimentos".

Enquanto na segunda parte do livro, “O desenvolvimento é uma viagem com mais náufragos do que navegantes”, discute-se a “Dependência econômica dos novos estados americanos em relação ao capitalismo europeu, sobretudo Inglês, que comandava a economia mundial do século XIX”.

Todavia, para justificarmos o mencionado no parágrafo anterior, recorremos a um fragmento do próprio livro que diz: “A expansão dos mercados latino-americanos acelerava a acumulação de capitais nos viveiros da indústria britânica”.

Entretanto, percebe-se cabalmente o valor que tem esta obra para entendermos todo esse contexto político, social e econômico que envolve a América Latina. 

Por fim, um livro que garimpa e evidencia toda essa engrenagem de saque e extorsão de um continente por uma trina europeia (Portugal, Espanha e Inglaterra), e posteriormente pelos americanos do norte nos parece uma chama sempre viva.

Cem Anos de Solidão

É, Uma tarefa complexa escrever um romance histórico de forma que prenda o leitor do início ao fim do enredo; porém, neste livro Garcia Márquez não somente fez essa mágica através do seu realismo fantástico, como discerniu a transcendência dos fatos com desenvoltura e paciência de um artesão ao narrar à saga dos Buendía; Trazendo para os amantes da literatura “Cem Anos de Solidão”, que de uma maneira fictícia estabelece relações com os eventos ocorridos na América Latina a partir da década de sessenta, com uma linguagem acessível e gostosa a qualquer leitor.

A presente obra está inserida entre muitos trabalhos escritos a respeito deste continente que teve suas populações massacradas, escravizadas e levadas à condição de subserviências pelos donatários do poder ao longo dessas eras. Assim sendo, de forma simples, mas contundente fizemos esse breve estudo comparativo sobre a obra do Escritor:


 
Gabriel García Márquez
MÁRQUEZ, Gabriel García. Cem Anos de Solidão. Tradução Eliane Zagury. 52ºed. Rio de Janeiro: Record, 2002.

Gabriel Garcia Márquez nasceu em aos 6 de março de 1927 em Aracataca  cidade colombiana, com um estilo arrojado de contador de estória, foi o responsável por criar o realismo mágico na literatura latino-americana.

Gabriel Garcia Márquez é escritor, jornalista, editor, ativista e político colombiano, viajara muito pelo mundo, essas viagens aliada as suas experiências de vida contribuiu, sobretudo, para que esse colombiano  perpassasse com maestria por vários campos do saber como literatura, jornalismo, cinema e política.

Mas especificamente, a literatura que fora a responsável pela projeção dele como escritor renomado e admirado no mundo inteiro, concedendo-lhes várias premiações; dentre tantas, destacamos a Medalha da Legião Francesa (Paris, 1981); Condecoração Águila Azteca (México, 1982) e Nobel de Literatura (1982).

A erudição e a clareza caracterizam seu trabalho, Garcia Márquez em sua obra fenomenal publicada em 1967 e que já ultrapassa mais de 50 edições, o livro Cem anos de Solidão, percebe-se a sua maestria de grande escritor ao narrar nesta obra a saga da família Buendía na pacata e fictícia cidade de Macondo, desde a sua fundação até a sétima geração.

Essa obra formidável de realismo fantástico pontua vários episódios históricos exibidos no palco do anfiteatro América Latina. Além de Cem Anos de Solidão Gabriel Garcia Márquez tem uma infinidades de livros publicados, iremos destacar neste trabalho apenas alguns que sejam mais condizentes com a nossa temática. Tais como: Relato de um Náufrago (1970); A Incrível e Triste História da Cândida Eréndira e da Sua Avó Desalmada (1974); O Outono do Patriarca (1978); Amor nos Tempos do Cólera(1985); O general em seu labirinto(1990).



O livro Cem Anos de Solidão é uma obra que transita entre a literatura, a história e a ciência, ao unir a perspectiva científica, de alicerce naturalista e evolucionista, ao tecimento literário, que se fundamentou num fatalismo trágico e numa visão romântica da natureza.

O autor teve a perspicácia de perceber, de maneira dramática, esse embate entre natureza e história e a partir de então, moldou Macondo como cenário, cuja "aldeia à margem de um rio de águas diáfanas", permitiria antever a cobiça dos forasteiros. “Recriou, pelo ritmo binário e pela sintaxe labiríntica", as chegadas esfuziantes dos ciganos "todos os anos, pelo mês de março" e o comportamento inquietante de seus habitantes.

É interessante também frisar que, a luz envolvente que emana de Cem Anos de Solidão é aquela que o espírito angustiado do autor precisou existir para se locupletar e nela se exprimir. Este colombiano através da imaginação vai dando vida a paisagem em sua volta, vendo por toda parte imagens e cenários que remetem à mitologia, à história e à literatura.

 A saga dos Buendía em Macondo, por exemplo, Gabriel García Márquez, a priori com muita destreza, já nos conduz, a um universo onde o confronto ideológico das personagens pululam de maneira clara e evidente.

Porém, em primeiro plano apresenta o tipo José Arcadio Buendía dominado pela emoção ao invés da razão, a visão subjetiva da realidade, a ânsia do desenvolvimento e a transformação do povoado.

No outro extremo, aparece a estereótipo de Úrsula Iguarán que se transveste de ficção e realidade, neste momento, é evidenciado o predomínio da razão sobre a emoção, a observação e a análise do comportamento humano.

Neste instante, o autor se revela de maneira sutil deixando transparecer sua frustração pela chegada do estranho.

Certamente, o autor através da perspicácia, sutileza e sensatez das mulheres que povoam Macondo mostra-se incomodado e ao mesmo tempo defensor de seu povoado.

Podemos ainda acrescentar que, as mulheres além de donas de casas e mães, também exercem as funções de orientadoras, informantes, sonhadoras, guerreiras, amantes, lideranças, e sempre conscientes de tudo que acontece em Macondo; sutilmente o autor mostra também os seus sonhos e desilusões, através das batalhas memoráveis travadas pelos heróis da independência da América Latina como Símon Bolívar, Miguel Hidalgos e tantos outros que morreram sem alcançar seus verdadeiros objetivos.

Mas, mesmo assim não tira esse ímpeto de decisão destas mulheres que romperam com os preceitos determinado pela sociedade, tecendo de maneira brilhante o papel social feminino na construção de um mundo digno e humanitário.

Porém, Gabriel García Márquez retrata muito bem isto através das personagens de Úrsula Iguarán, Amaranta, Pilar Ternera e Amaranta Úrsula. Contudo, o feito destas mulheres de Macondo muito nos lembra a participação das mulheres nas lutas pela independência política da América Latina.

Todavia, sabe-se que, Cem Anos de Solidão foi escrito da efervescência das ditaduras latino-americanas e na sedimentação das multinacionais no continente. Gabriel García Márquez é um autor fantástico, pois, teceu a obra de uma maneira tal que, enfatizou também, a exploração do homem pelo homem; a exploração da terra; o poder exercido pela igreja; a influência da universidade e principalmente a política caudilhista e os embates partidários.

Conquanto, a partir de então, o Gabriel García Márquez, vai dando vida a suas personagens no suntuoso anfiteatro "América Latina".

O autor pontua de forma magistral a atuação da igreja católica em Macondo, mostrando que, através das pregações e atitudes ambíguas da personagem do padre Nicanor, pode-se perceber nitidamente que, é uma mera semelhança das práticas que esta instituição vem desempenhando na América Latina desde a chegada dos europeus ao Novo Continente.

O autor também é muito perspicaz quando mostra Macondo sendo tomada por lutas civis permanentes em torno de dois grupos políticos, os liberais e os conservadores. Neste ínterim, a figura caudilhista entra em cena; esses figurões na pós-independência dos países latino-americanos foram os detentores de grandes latifúndios, poder político, arbitrários e grandes mestres nas práticas fraudulentas dos processos eleitorais.

E ainda outro ponto importante no qual, se enquadra tal asserção seria os conflitos partidários entre os unitaristas e os federalistas desencadeados na Argentina. Onde os unitaristas representavam à civilização e os federalistas a barbárie. Isto é, o confronto entre cidade x campo.

O autor pontua muito bem essa política caudilhista e os embates partidários através das ações das personagens de José Arcádio Buendía, do seu filho o coronel Aureliano Buendía, do seu neto Arcádio e do Sr. Apolinar Moscote.

Outro ponto significativo que, o autor destaca também na obra é a influência que a universidade proporcionou no continente Latino Americano, porém, é na figura do cigano Melquíades que através de suas experiências científicas e a montagem de um laboratório em Macondo que ele deixa transparecer a importância deste estabelecimento educacional.

García Márquez abordou nesta obra o povoado Macondo que significa república de bananas como uma comunidade primitiva, dominada pela saga da família Buendía, onde haveria o amor livre e o coletivismo dos bens.

Ademais uma aldeia que tinha uma exuberante vegetação sustentada por um solo fértil, e que de tempos em tempos era visitada por estranhos. É claro que logo seria invadida e explorada. Era só questão de tempo.

Podemos reforçar isto que falamos com palavras do próprio autor: "Não houve, entretanto, muito tempo para pensar no assunto, porque os desconfiados habitantes de Macondo mal começavam a si perguntar que diabo era o que estava acontecendo, quando já a aldeia se tinha transformado em acampamento de casas de madeira com teto de zinco, povoado por forasteiros...”.

E ainda, é interessante também reter a fala de um Buendía a respeito da invasão: "Olhem a confusão em que nos metemos só por termos convidado um americano para comer banana".

Finalmente em a luta política o autor de Cem Anos de Solidão narrou os acontecimentos de guerra, que levaram ao extermínio de Macondo. Procurando mostrar como os dois lados do conflito – a área rural e a área urbana –, se encontravam tomadas por fanatismo políticos e econômicos.



Referências bibliográficas
www.google.com.br acessado em 10 de maio de 2012.
www.explicatorium.com acessado em 10de maio de 2012.
KARNAL, Leandro (org.) et al.. História na sala de aula:conceitos,práticas e propostas.6ºed.São Paulo:Contexto,2010.
BITTENCOURT, Circe (org.) et al.. Dicionário  de datas da História do Brasil.São Paulo:contexto,2007.
MÁRQUEZ, Gabriel García. Cem Anos de Solidão. Tradução Eliane Zagury. 52ºed. Rio de Janeiro: Record,2002.
GALEANO, Eduardo. As Veias Abertas da América Latina. 41ºed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.