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sábado, 25 de julho de 2015

MULHERES SOBRE O 25 DE JULHO: A LUTA CONTRA A INVISIBILIDADE É CONSTANTE



Além dos problemas de gênero enfrentados no continente latino como o machismo e desigualdades no mercado de trabalho, a mulher negra precisa lidar com os conflitos raciais, entre eles, a esteriotipação do corpo negro.
Por Norma Odara e Simone Freire. De São Paulo (SP)

O protagonismo da mulher negra na luta por direitos e igualdade de gênero ganha cada vez mais espaço. Criado em 1992, o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha tem fortalecido esta luta contra a invisibilidade, mas o enfrentamento a estes problemas faz parte do cotidiano diário de cada uma delas.
Há particularidades na realidade da mulher negra na sociedade hoje, que são resquícios dos anos de desigualdades do período colonial, escravocrata e patriarcal. Além dos problemas de gênero enfrentados no continente latino por todas as mulheres, como o machismo e desigualdades no mercado de trabalho, a mulher negra também precisa lidar com os conflitos raciais, como o racismo e a esteriotipação do corpo negro, muitas vezes ligado à satisfação sexual.
No Brasil, segundo o “Dossiê mulheres negras: retrato das condições de vida das mulheres negras no Brasil”, publicado em 2013 pela ONU Mulheres em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) e a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), existe um impacto do racismo e do sexíssimo na vida das mulheres negras na educação, mercado de trabalho, economia do cuidado, pobreza e desigualdade de renda, vitimização e acesso à justiça.



A situação diferenciada dessas mulheres em relação ao "sujeito universal do feminismo" possibilitou que elas percebessem que precisavam e deveriam juntas, falar de suas especificidades avalia Djamila Ribeiro, feminista negra e mestranda em Filosofia Política na Unifesp.
"O racismo cria uma hierarquia entre as mulheres, coloca a mulher negra na base da pirâmide social. Sendo assim, é necessário pensar ações que deem visibilidade a isso. Mulheres negras são as que mais sofrem com abortos mal realizados, violência doméstica, morte materna. Quando se falar de mulher, tem que se perguntar de qual mulher se está falando", pontua Djamila.
Ao tentar romper com esta realidade, entrando no mercado de trabalho formal ou na universidade, por exemplo, a mulher negra percebe que apenas "sair da base da pirâmide social" não é o suficiente. Tamires Gomes Sampaio, vice-presidente da União Nacional dos Estudantes e ex-presidenta do Centro Acadêmico de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo (SP), observa que mesmo dentro de certos espaços historicamente negados às mulheres negras, a luta não cessa.
"Ser mulher negra em um espaço de liderança, como a presidência de um CA, é uma batalha diária e constante, por que esses espaços historicamente não foram feitos para nós. Não à toa em 60 anos eu fui a primeira mulher negra a estar nesse cargo. Mas mesmo com todo o histórico conservador do Mackenzie, conseguimos ultrapassar essas barreiras junto aos alunos que nos ajudaram e companheiros de gestão. Foi uma experiência emancipadora, pois colocou em xeque diversas questões sobre a forma como o racismo se reproduz e manifesta", disse.

Debate em expansão
Quando coloca a mulher no centro do debate e proporciona discussões, o 25 de julho consegue fortalecer as articulações feministas. Para Djamira, o uso das redes sociais, neste sentido, tem sido crucial. "O crescimento da discussão sobre o tema é de extrema importância, e acho que isso se deve também às redes sociais, cada vez mais há páginas sobre o tema, grupos virtuais e blogs, o que possibilita a instrumentalização da militância", avalia.
O desejo de expandir a luta não só nas cidades, mas no interior, é compartilhado pela cantora e militante Nega Duda, forte atuante no bairro de Cidade Tiradentes, na Zona Leste de São Paulo (SP), cuja população é majoritariamente negra.
"Como mulher negra me sinto em constante luta pelo meu espaço, por aceitação e por menos desigualdade. O 25 de julho é mais um dia para estarmos a frente daquilo que merecemos e estamos lutando por isso dia a dia. Intelectual não sou não, mas sou uma intelectual das marcas da vida", diz.
A data também representa uma quebra da hierarquia natural dos dias comemorativos no Brasil, que na maioria das vezes são datas cristãs e impostas à população, avalia Mariana Laiola, professora e socióloga. O 25 de julho, diz ela, também nasceu da luta das massas e é um momento que representa a luta contra as opressões sofridas pela população negra.
"A luta anti-racista e anti-machista é cotidiana e expressada por todas as mulheres e homens negros que saem todos os dias de suas casas na esperança de transformar a sua realidade. Eles e elas enfrentam a violência policial, o machismo, a falta de emprego, a pouca representatividade nas grandes mídias, a desigualdade social, a discriminação dentro dos espaços públicos e privados. E é essa a história de luta que queremos dar ênfase e refletir nas datas", explica.

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25/07/2015


AS COISAS PARA O POVO PRETO TÊM PIORADO

Confira entrevista com o poeta negro baiano Nelson Maca, especialista em literatura negra. Escritor e militante, Maca é professor da Universidade Católica de Salvador (Ucsal) e autor do livro "Gramática da Ira". Nesta entrevista, ele aborda assuntos como a cultura negra e o preconceito racial.
Por Júlio Lacerda do Rio de Janeiro (RJ)

Nelson Maca


Brasil de Fato: Na cena brasileira, o que você destacaria na luta contra o racismo?
Nelson Maca: O movimento que mais admiro hoje é o Reaja ou Será Morto, Reaja ou Será Morta. Meu contato maior é com o núcleo da Bahia, que reúne uma galera muito forte lado a lado com Hamilton Borges e Doutora Andrea Beatriz. Eles botam o dedo na ferida e provam que, apesar de todo discurso de emancipação atual, as coisas para o povo preto têm piorado. Da luta pela inserção cidadã rebaixou-se para a luta contra a própria morte!
Brasil de Fato: Hoje há uma espécie de movimento de saraus se articulando e se ampliando no Brasil. O movimento negro está nele?
Nelson Maca: Há, sim, uma cena de Sarau que, a cada dia se amplia e fortalece no Brasil. Hoje, felizmente, cresce nesse contexto eventos centrados ou que dialogam mais profundamente com a negritude. Não vejo o Movimento Negro, no sentido mais tradicional, envolvido nele. No entanto, considero essas iniciativas como uma nova modalidade de movimento negro, mais arejada e com mais respeito pela literatura em si, e também pelas demais expressões que formatam os diversos saraus.
Brasil de Fato: Se tratando de Rio de Janeiro, para além do samba, o funk e o hip-hop popularizam também uma arte que expressa a cultura negra? É por aí mesmo?
Nelson Maca: Com certeza. Mesmo com suas contradições internas, são linguagens e culturas que se estabelecem no âmbito da população negra e, assim, expressam suas demandas, independente de sua aceitação ou não por outras comunidades, outras ou também negras. O principal do Funk e do Rap – e a cultura hip hop como um todo – é que se tratam de vozes renovadas e, normalmente, jovens e urbanas.
Brasil de Fato: Sobre as realidades da luta social do povo negro, qual seria a principal semelhança e diferença entre Rio e Salvador?
Nelson Maca: Não vejo diferenças efetivas. O genocídio físico e cultural do povo negro caminha igualmente nos dois estados. Preconceito e racismo não têm fronteira regional, nacional ou internacional. Da forma como as experimentamos no Brasil se dá em qualquer país de hegemonia branca que se utilizou da cultura da escravidão negra para se estabelecerem como estão hoje.
Brasil de Fato: O que seria um poeta da literatura negra?
Nelson Maca: Primeiramente um poeta preto que escreve em primeira pessoa, ou seja, um eu negro. Na temática, sua poesia traz um fundo etno-cultural baseado nas demandas e experiência na e da Negritude. Suas imagens desrecalcam elementos e símbolos negros soterrados pelo etnocentrismo da literatura “branco-européia” brasileira. Na textura, palavras, expressões, sons e ritmos do mundo negro.
Brasil de Fato: Como surgiu esse projeto de livro? Qual o propósito do "Gramática da Ira” O que você destacaria como mais importante nele?
Nelson Maca: Surge do meu desejo de registrar minha obra em material gráfico. Esse desejo associado aos pedidos e cobranças de amigos, admiradores e outros escritores, impulsionaram a publicação da Gramática da Ira. O propósito do livro é ser um instrumento de prazer estético e de luta, sem hierarquia de valor. Tanto ser livro para leitura com ser uma arma para militância.


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13/07/2015