Além dos problemas de gênero enfrentados no continente latino como o
machismo e desigualdades no mercado de trabalho, a mulher negra precisa lidar
com os conflitos raciais, entre eles, a esteriotipação do corpo negro.
Por Norma Odara e
Simone Freire. De São Paulo (SP)
O protagonismo da
mulher negra na luta por direitos e igualdade de gênero ganha cada vez mais
espaço. Criado em 1992, o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e
Caribenha tem fortalecido esta luta contra a invisibilidade, mas o
enfrentamento a estes problemas faz parte do cotidiano diário de cada uma
delas.
Há particularidades
na realidade da mulher negra na sociedade hoje, que são resquícios dos anos de
desigualdades do período colonial, escravocrata e patriarcal. Além dos
problemas de gênero enfrentados no continente latino por todas as mulheres,
como o machismo e desigualdades no mercado de trabalho, a mulher negra também
precisa lidar com os conflitos raciais, como o racismo e a esteriotipação do
corpo negro, muitas vezes ligado à satisfação sexual.
No Brasil, segundo o “Dossiê mulheres negras: retrato das condições de
vida das mulheres negras no Brasil”, publicado em 2013 pela ONU Mulheres em
parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Secretaria de
Políticas para as Mulheres (SPM) e a Secretaria de Políticas de Promoção da
Igualdade Racial (SEPPIR), existe um impacto do racismo e do sexíssimo na vida
das mulheres negras na educação, mercado de trabalho, economia do cuidado,
pobreza e desigualdade de renda, vitimização e acesso à justiça.
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A situação
diferenciada dessas mulheres em relação ao "sujeito universal do
feminismo" possibilitou que elas percebessem que precisavam e deveriam
juntas, falar de suas especificidades avalia Djamila Ribeiro, feminista negra e
mestranda em Filosofia Política na Unifesp.
"O racismo
cria uma hierarquia entre as mulheres, coloca a mulher negra na base da
pirâmide social. Sendo assim, é necessário pensar ações que deem visibilidade a
isso. Mulheres negras são as que mais sofrem com abortos mal realizados, violência
doméstica, morte materna. Quando se falar de mulher, tem que se perguntar de
qual mulher se está falando", pontua Djamila.
Ao tentar romper
com esta realidade, entrando no mercado de trabalho formal ou na universidade,
por exemplo, a mulher negra percebe que apenas "sair da base da pirâmide
social" não é o suficiente. Tamires Gomes Sampaio, vice-presidente da
União Nacional dos Estudantes e ex-presidenta do Centro Acadêmico de Direito da
Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo (SP), observa que mesmo
dentro de certos espaços historicamente negados às mulheres negras, a luta não
cessa.
"Ser mulher
negra em um espaço de liderança, como a presidência de um CA, é uma batalha
diária e constante, por que esses espaços historicamente não foram feitos para
nós. Não à toa em 60 anos eu fui a primeira mulher negra a estar nesse cargo.
Mas mesmo com todo o histórico conservador do Mackenzie, conseguimos
ultrapassar essas barreiras junto aos alunos que nos ajudaram e companheiros de
gestão. Foi uma experiência emancipadora, pois colocou em xeque diversas
questões sobre a forma como o racismo se reproduz e manifesta", disse.
Debate em expansão
Quando coloca a
mulher no centro do debate e proporciona discussões, o 25 de julho consegue
fortalecer as articulações feministas. Para Djamira, o uso das redes sociais,
neste sentido, tem sido crucial. "O crescimento da discussão sobre o tema
é de extrema importância, e acho que isso se deve também às redes sociais, cada
vez mais há páginas sobre o tema, grupos virtuais e blogs, o que possibilita a
instrumentalização da militância", avalia.
O desejo de
expandir a luta não só nas cidades, mas no interior, é compartilhado pela
cantora e militante Nega Duda, forte atuante no bairro de Cidade Tiradentes, na
Zona Leste de São Paulo (SP), cuja população é majoritariamente negra.
"Como mulher
negra me sinto em constante luta pelo meu espaço, por aceitação e por menos
desigualdade. O 25 de julho é mais um dia para estarmos a frente daquilo que
merecemos e estamos lutando por isso dia a dia. Intelectual não sou não, mas
sou uma intelectual das marcas da vida", diz.
A data também
representa uma quebra da hierarquia natural dos dias comemorativos no Brasil,
que na maioria das vezes são datas cristãs e impostas à população, avalia
Mariana Laiola, professora e socióloga. O 25 de julho, diz ela, também nasceu
da luta das massas e é um momento que representa a luta contra as opressões
sofridas pela população negra.
"A luta anti-racista e anti-machista é cotidiana e expressada por
todas as mulheres e homens negros que saem todos os dias de suas casas na
esperança de transformar a sua realidade. Eles e elas enfrentam a violência
policial, o machismo, a falta de emprego, a pouca representatividade nas
grandes mídias, a desigualdade social, a discriminação dentro dos espaços
públicos e privados. E é essa a história de luta que queremos dar ênfase e
refletir nas datas", explica.
http://www.brasildefato.com.br/
25/07/2015