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sexta-feira, 29 de agosto de 2014

INDÍGENAS E A MEMÓRIA ESCOLAR

Quando pensamos em um português, espanhol, inglês do século XVI e o comparamos com um europeu de mesma nacionalidade dos dias de hoje, não nos assustamos ao ver como as culturas desses países mudaram, mas a identidade da nação se manteve. Mas, se fizermos o mesmo exercício com nações indígenas do século XVI e as de hoje, não aceitamos indígenas que utilizam internet, veem televisão ou frequentam universidades.

Esperamos que, para serem  indígena, ainda vivam 500 anos atrás, como se a cultura indígena fosse pura e imutável. É claro que existem povos que não tiveram sequer contato com o restante do Brasil, mas também existem indígenas que, mesmo mantendo suas identidades como tal, não vivem em ocas, tribos ou vivem da caça e da coleta.

Neste sentido vejamos o texto do Moutinho: ao contrário do direcionamento incontável de análise sobre o negro, desde o início do século – problematizando e enfocando os horrores da escravidão –, o índio tem ocupado um espaço microscópio em nossa historiografia.

Esse lugar infinitamente pequeno e secundário que foi dedicado à história indígena tem legado esses povos ao esquecimento, ou lembrados subitamente em flashes sensacionalistas. O índio tem uma história; uma história indubitavelmente plural. É necessário [...] desconstruir abordagens simplistas que eurocentrizaram as análises, configurando o indígena num ambiente social exótico e primitivo.

Essa ressignificação histórica é também um ressignificar de consciência. Para os indígenas, é um olhar-se sobre si, reconstruindo suas identidades que, por tanto tempo foram mascaradas e ou desconfiguradas por uma miopia historiográfica. As representações criadas para o indígena brasileiro ainda são projetadas e extrapoladas no infinito, passando a justificar tanto o presente quanto o futuro.


[...] Se ampliarmos o poder da nossa lente, perceberemos que, nos níveis escolares de primeiro e segundo graus, as representações construídas para o indígena brasileiro são ainda mais distorcidas e comprometedoras. Infelizmente o livro didático ainda é o filho bastardo das discussões e produções acadêmicas. O pouco que se tem avançado nessa área nas universidades ainda não atingiu em cheio os manuais didáticos. 

[...] Esse eixo temático deve, em regime de urgência, ser ampliado e apresentado de forma mais consistente no livro didático, articulando-se então a outros temas. Para isso faz-se necessária uma desconstrução, principalmente no tocante a periodizações e tematizações. Geralmente, por ordem didática, ou até mesmo por determinações mercadológicas, os capítulos são estratificados (política, economia, sociedade), limitando os aspectos culturais a subitens, quando não determinados por estruturas econômicas.


Outrossim, o conceito de sincretismo deve ser revisto. Afastando a possibilidade de folclorização da cultura indígena, que ainda vem sendo tratada como elemento estático na História do Brasil. Esse sincretismo deverá ser percebido num contexto de circularidades e inter-relações com outras culturas. Reduzir a contribuição da cultura indígena a sua “herança”(vocabulário, comidas...), tal como vemos nos livros didáticos, é compreender a sua história.

Vale ressaltar que não se trata de decompor os discursos, tomando-lhes de assalto, num estado genérico de histeria revanchista. [...] Portanto, reescrevera História Indígena é, antes de tudo, modificar os discursos que durante tanto tempo representaram os nossos nativos com os mais nocivos e pejorativos adjetivos. É apontar definitivamente, perspectivas mais seguras de compreensão do universo histórico e cultural do índio.  
                                                                                                                                                                            MOUTINHO, Augusto. O índio brasileiro ainda um vazio na história. In: FERREIRA, João Paulo Hidalgo Mesquita& 

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