Quando pensamos em um
português, espanhol, inglês do século XVI e o comparamos com um europeu de
mesma nacionalidade dos dias de hoje, não nos assustamos ao ver como as
culturas desses países mudaram, mas a identidade da nação se manteve. Mas, se
fizermos o mesmo exercício com nações indígenas do século XVI e as de hoje, não
aceitamos indígenas que utilizam internet, veem televisão ou frequentam
universidades.
Esperamos que, para
serem indígena, ainda vivam 500 anos
atrás, como se a cultura indígena fosse pura e imutável. É claro que existem
povos que não tiveram sequer contato com o restante do Brasil, mas também
existem indígenas que, mesmo mantendo suas identidades como tal, não vivem em
ocas, tribos ou vivem da caça e da coleta.
Neste sentido vejamos o
texto do Moutinho: ao contrário do direcionamento incontável de análise sobre o
negro, desde o início do século – problematizando e enfocando os horrores da
escravidão –, o índio tem ocupado um espaço microscópio em nossa
historiografia.
Esse lugar infinitamente
pequeno e secundário que foi dedicado à história indígena tem legado esses
povos ao esquecimento, ou lembrados subitamente em flashes sensacionalistas. O
índio tem uma história; uma história indubitavelmente plural. É necessário
[...] desconstruir abordagens simplistas que eurocentrizaram as análises,
configurando o indígena num ambiente social exótico e primitivo.
Essa ressignificação
histórica é também um ressignificar de consciência. Para os indígenas, é um
olhar-se sobre si, reconstruindo suas identidades que, por tanto tempo foram
mascaradas e ou desconfiguradas por uma miopia historiográfica. As
representações criadas para o indígena brasileiro ainda são projetadas e
extrapoladas no infinito, passando a justificar tanto o presente quanto o
futuro.
[...] Se ampliarmos o poder
da nossa lente, perceberemos que, nos níveis escolares de primeiro e segundo
graus, as representações construídas para o indígena brasileiro são ainda mais
distorcidas e comprometedoras. Infelizmente o livro didático ainda é o filho
bastardo das discussões e produções acadêmicas. O pouco que se tem avançado
nessa área nas universidades ainda não atingiu em cheio os manuais didáticos.
[...] Esse eixo temático
deve, em regime de urgência, ser ampliado e apresentado de forma mais
consistente no livro didático, articulando-se então a outros temas. Para isso
faz-se necessária uma desconstrução, principalmente no tocante a periodizações
e tematizações. Geralmente, por ordem didática, ou até mesmo por determinações
mercadológicas, os capítulos são estratificados (política, economia,
sociedade), limitando os aspectos culturais a subitens, quando não determinados
por estruturas econômicas.
Outrossim, o conceito de
sincretismo deve ser revisto. Afastando a possibilidade de folclorização da
cultura indígena, que ainda vem sendo tratada como elemento estático na
História do Brasil. Esse sincretismo deverá ser percebido num contexto de
circularidades e inter-relações com outras culturas. Reduzir a contribuição da
cultura indígena a sua “herança”(vocabulário, comidas...), tal como vemos nos
livros didáticos, é compreender a sua história.
Vale ressaltar que não se
trata de decompor os discursos, tomando-lhes de assalto, num estado genérico de
histeria revanchista. [...] Portanto, reescrevera História Indígena é, antes de
tudo, modificar os discursos que durante tanto tempo representaram os nossos
nativos com os mais nocivos e pejorativos adjetivos. É apontar definitivamente,
perspectivas mais seguras de compreensão do universo histórico e cultural do
índio.
MOUTINHO, Augusto. O índio
brasileiro ainda um vazio na história. In: FERREIRA, João Paulo Hidalgo
Mesquita&
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