Importância das florestas para a estabilidade
do clima, o papel dos povos indígenas e suas reivindicações pelo território e
pelo fim da violência contra seus líderes ganham visibilidade e apoio nas
vésperas da COP-21.
Hoje,
em média, um indígena morre a cada semana por lutar por seus direitos, revela o
documentário “If not us then who?” – “Se não formos nós, então quem será?” –
lançado em Paris, na semana passada. O filme foi lançado com a participação de
lideranças indígenas, às vésperas do início da Conferência do Clima de Paris
(COP 21), nesta segunda (30/11), reforçando o chamado à conservação das
florestas e à solidariedade aos povos indígenas, atores fundamentais da
proteção ao meio ambiente e, ao mesmo tempo, alvo dos impactos das mudanças
climáticas.
“If not
us then who?” foi feito pela Handcrafted films e dirigido por Paul Redman
durante dois anos e meio e faz parte da campanha internacional com o mesmo nome
e cujo objetivo é o reconhecimento da contribuição dos indígenas para a
conservação das florestas e para o equilíbrio do clima. Histórias emblemáticas
de lideranças indígenas na Indonésia, Peru, Brasil, Costa Rica, Honduras e em
outros países são contadas pelos próprios indígenas no filme. As diversas
histórias em formato de curta-metragem estão acessíveis no site da campanha,
também em língua portuguesa (veja aqui).
“Nós
não devemos idealizar a vida dos povos indígenas, mas nós devemos aprender com
a sua sabedoria e sua sobriedade, algo que falta nos dias de hoje em nossa
sociedade. Os índios estão na linha de frente da luta contra o desmatamento. O
combate deles é nossa luta”, afirmou Nicolat Hulot, ambientalista francês,
enviado especial do presidente da França para a proteção do planeta, no
lançamento.
“Minha
mensagem para os povos indígenas brasileiros é que a sua dor e a sua luta são
compartilhadas no mundo todo por outras comunidades indígenas, na Indonésia, no
Peru, no Congo e eles devem reunir forças com seus irmãos e irmãs que lutam da
mesma maneira”, disse Redman.
Apenas
em 2014, teriam sido mortos, no mundo, pelo menos 46 indígenas por combaterem a
destruição do meio ambiente, segundo o relatório "How many more?",
publicado pela ONG Global Witness, em 2015. O documento sugere que o número de
vítimas deve ser bem maior, visto que os assassinatos nem sempre são
devidamente contabilizados por ocorrerem no meio das florestas e em locais
isolados.
A
Handcraft lançou também o documentário “Liberdade”, que conta a história de
conquista de direitos à terra de duas comunidades quilombolas no Brasil (veja o vídeo).
O
papel questionável dos governos
A ação
dos governos nem sempre corresponde ao seu discurso no âmbito internacional
sobre o papel dos indígenas em relação à mudança do clima. Por exemplo, o
governo do Peru tem se mostrado favorável à defesa das florestas e das
populações indígenas desde a organização da COP 20, em Lima. Junto com o
governo francês, o Peru patrocina um diálogo entre os negociadores dos países e
as lideranças indígenas na Convenção do Clima da ONU para ouvir suas demandas
em relação ao futuro acordo do clima (saiba mais).
Lideranças
indígenas contestam, entretanto, as políticas da administração peruana dentro
do País. “Nada mudou no Peru. O governo segue dando prioridade às concessões
madeireiras e mineiras em detrimento da titulação dos territórios indígenas”,
denuncia Diana Ríos. Ela é filha do líder indígena Jorge Ríos, assassinado no
Peru, perto da fronteira com o Brasil, em 2014, por defender as florestas de
sua comunidade do Alto Tamaya-Saweto, na região de Ucayali, contra madeireiros
ilegais e narcotraficantes.
No
Peru, foram aprovadas 35.658 concessões mineiras, entre 2007 e 2015, enquanto
apenas 50 comunidades indígenas receberam o título oficial de seus territórios
no mesmo período, segundo o relatório “Peru na encruzilhada climática”, da
Associação Interétnica de Desenvolvimento da Selva Peruana (AIDESEP) e da
Rainforest Foundation-US, de 2015.
O
relatório também mostra que, atualmente, são necessários 27 passos
administrativos, que podem levar entre 10 e 25 anos, para que comunidades
indígenas e tradicionais tenham seus territórios reconhecidos no Peru, enquanto
apenas três passos administrativos são exigidos para a obtenção de concessões
de exploração florestal e sete para concessões mineiras.
Em toda
Bacia Amazônica, calcula-se que existam 100 milhões de hectares de terras
indígenas ainda sem demarcar, o que deixa muitos povos sem garantias legais
sobre os seus territórios. As áreas que carecem de reconhecimento oficial
contêm 22,2% do carbono florestal da região, segundo o Woods Hole Research
Center.
Na
Bacia Amazônica, terras indígenas e áreas protegidas habitadas por povos
indígenas contêm 32,8% dos estoques de carbono florestal na região – 28.247
milhões de toneladas de carbono (leia mais).
“Os
povos indígenas não são contra o desenvolvimento. Eles são a favor de um
desenvolvimento que respeite os territórios, os recursos naturais e as relações
saudáveis entre as pessoas”, afirmou Victoria Tauli-Corpuz, relatora especial
da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, no documentário “If not us then
who?”. Tauli-Corpuz também afirmou que o individualismo é um dos grandes
problemas do mundo hoje e que os valores de solidariedade e da coletividade dos
povos indígenas deveriam ser aprendidos pelas pessoas.
O filme
mostra diversos exemplos de manejo florestal comunitário feito por populações
indígenas. Na Indonésia, por exemplo, indígenas da comunidade de Setulang estão
usando a tecnologia de drones para o monitoramento dos territórios e florestas.
Na Costa Rica, indígenas realizam o manejo sustentável das florestas, constroem
escolas e postos de saúde com recursos recebidos do Estado sobre impostos sobre
combustíveis fósseis.
(veja documentário; legendas em português).
(veja documentário; legendas em português).
O
documentário mostra ainda as conquistas realizadas pelas quebradeiras de coco
babaçu, uma luta liderada por mulheres que conseguiram a demarcação de algumas
reservas e o apoio à sua atividade tradicional e comunitária (veja o vídeo; legendas em
português).
“Os
governos também devem incluir a contribuição dos Povos indígenas nas INDCs
[contribuições nacionalmente determinas, que compõem as metas dos países para a
redução de emissões de gases de efeito estufa na Convenção da ONU]. Porque nós
[os povos indígenas] também temos uma contribuição a dar pelo clima e isso deve
ser contabilizado”, afirmou Mina Setra, liderança indígena do West Kalimantan,
Indonésia. “Os povos indígenas dão exemplos ao mundo todo sobre estilos de vida
de baixa emissão de carbono. Nossa grande tarefa é transmitir a mensagem de que
há esperança. Essa esperança é trazer a vocês nossa experiência, nossa vida e
nossa conexão com as florestas”, afirmou Setra.
Sábado, 28 de Novembro de 2015.
FONTE: http://www.socioambiental.org