Em entrevista, Avelino Ganzer,
primeiro vice-presidente da CUT na década de 1980, denuncia que “os grupos que controlam
a mídia são os que concentram riqueza e poder”.
Leonardo Severo, em Belém (PA),
do Informa CUT
Avelino Ganzer - Foto: Leonardo Severo/CUT |
“Os grupos que controlam a mídia
são basicamente os mesmos que concentram riqueza e poder em articulação com o
capitalismo internacional. Nesta batalha contra a dominação política e o
controle da informação, democratizar a comunicação é chave para combater a
ditadura do grande capital”.
A afirmação é de Avelino Ganzer,
primeiro vice-presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e grande
liderança dos trabalhadores rurais na luta contra a ditadura, que participou na
terça-feira (14), em Belém, no Pará, como painelista no Seminário de
Planejamento da Central na região Norte.
Atualmente chefe do escritório
especial da Secretaria Geral da Presidência da República em Altamira (PA), aos
65 anos, o homem que sobreviveu a acidente aéreo e a um sem número de cercos e
ameaças, traça paralelo entre os desafios dos movimentos sindical e social de
ontem e hoje, sublinhando a relevância do seu protagonismo para alterar a
correlação de forças na sociedade.
Nesta entrevista, o veterano
dirigente faz um amplo resgate da cultura amazônida, fala das riquezas da
região, condena a superexploração do meio ambiente e da mão de obra pelas
transnacionais, e destaca o papel da consciência e da ação coletivas para
defender o interesse da classe trabalhadora. “Sempre defendemos a necessidade
de consolidar um grande time, com unidade na diversidade, para avançar até
esgotar os limites da pauta comum”, ressaltou Avelino, lembrando a máxima de um
velho militante de Pacajá: “governo é como galo velho, só fica bom na pressão”.
Brasil de Fato: O que diferencia a Amazônia
das demais regiões?
Avelino Ganzer: A
Amazônia legal é uma região rural muito forte. Nossas cidades, mesmo capitais
imensas como Manaus e Belém, têm uma relação muito estreita com a ruralidade, o
que é diferente de dizer com a agricultura. Esta ruralidade é natureza, água,
floresta, as riquezas naturais no solo e no subsolo, e as populações no seu
contexto geral.
Brasil de Fato: Há um componente indígena
muito forte.
Avelino Ganzer: A população nativa nos estados mais
antigos tem uma cultura indígena muito forte, mas que obviamente também
encontram-se submetidas aos impactos do sistema capitalista. É uma população
que não tem a relação com a propriedade; para ela, a terra não é uma
mercadoria. Não há essa ideia de que a terra até aqui é minha e dali pra lá é
tua.
A forma violenta como se impõe o sistema capitalista fere de morte estas
comunidades. Daí a necessidade de termos muito cuidado na demarcação de terras
indígenas, pois essa é uma população sobrevivente. Para o capitalismo, que
despreza todo o acúmulo desse processo social e cultural de convivência e
espaços públicos, essas comunidades são um obstáculo a ser removido, um atraso
à expansão da sua lógica. Se a escola entrasse, se a ciência entrasse, se a
grade curricular viesse a essas comunidades para impulsionar um sistema que
respeitasse e mantivesse sua cultura, teríamos enfim desenvolvimento
sustentável.
Esse nó na Amazônia não está resolvido, assim como não está
resolvida a questão dos quilombolas, da população negra que resistiu e continua
resistindo.
Brasil de Fato: A situação se complica
ainda mais em função das imensas riquezas naturais de uma região que é alvo da
cobiça internacional?
Avelino Ganzer: Claro que sim. Temos aqui vários
dos minérios mais importantes do mundo: minério de ferro, bauxita (que produz
alumínio), ouro, cobre, cassiterita, manganês, tudo em quantidade. No
município de Itaituba, no alto do rio Tapajós, onde vão construir
hidrelétricas, de 1974 até 1980, havia um aeroporto que era mais movimentado do
que o de Cumbica, em
São Paulo. Era um perigo de tanta aeronave que subia e descia
com o ouro que saia clandestinamente para o Paraguai, para o Uruguai, países
que não tinham ouro e viraram exportadores.
Enquanto isso muita gente daqueles
verdadeiros formigueiros humanos morria de malária, de disputa de vida ou morte
na base da foice e de facão. Na região, muitas multinacionais que apoiaram a
ditadura foram beneficiadas com grandes áreas de terra, milhares de hectares,
da qual tiraram muita riqueza. Mesmo hoje há fazendas com 200
retroescavadeiras, com muito maquinário mesmo, sem a necessária fiscalização,
devido à fragilidade do Estado.
Brasil de Fato: Mas o Estado brasileiro,
infelizmente, continua financiando a exportação de commodities ou produtos sem
valor agregado.
Avelino Ganzer: Um dos exemplos disso é a
hidrelétrica de Tucuruí, feita para fazer funcionar o complexo siderúrgico de
Barcarena. Ali, depois de utilizarem a nossa energia, a bauxita vira lingotes
de alumínio. A população subsidia há décadas esse beneficiamento primário. Se
você olha a geração desta riqueza, onde é que ela vai gerar os melhores
empregos, os melhores salários, não é na Amazônia. Aqui fica o trabalho
desgraçado, os resíduos ambientais, os detritos, a poluição, o caos. Precisamos
agir contra esta exploração predatória, que enriquece uns poucos que levam
embora o que é nosso.
Brasil de Fato: É uma realidade de saque
invisibilizada pela grande mídia, pois seus anunciantes lucram com a manutenção
desta lógica. Qual a sua avaliação sobre a campanha pela liberdade de expressão
defendida pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e pela
CUT?
Avelino Ganzer: Os grupos que controlam a mídia são
basicamente os mesmos que concentram riqueza e poder em articulação com o
capitalismo internacional. Nesta batalha contra a dominação política e o
controle da informação, democratizar a comunicação é chave para combater a
ditadura do grande capital.
No meu entendimento é fundamental este esforço
democratizante pela regulamentação do setor, que desperta o medo das elites.
Essa mobilização pode resultar vitoriosa com uma campanha mais qualificada, de
massa, que ganhe as ruas, o que não é fácil. Daí a necessidade, também, de
azeitarmos os nossos próprios meios de comunicação, como o site da CUT e todos
os demais instrumentos da Central e dos movimentos sociais que se articulam em
favor da democracia.
Brasil de Fato: Nas tuas falas sempre está
presente a palavra unidade e, mais do que um recado aos mais jovens, soa como
conclamação.
Avelino Ganzer: Sempre defendemos a necessidade de
consolidar um grande time no sindicalismo, com unidade na diversidade, para
avançar até esgotar os limites da pauta comum. Acho que devemos gastar mais
energia no diálogo, procurando entender a diversidade, pois a falta de clareza
nos fragiliza. É desta forma que compreendo a construção de uma nova hegemonia
do campo democrático e popular, que precisa colocar sua pauta e ampliar a
pressão, exercer sua independência e autonomia de qualquer governo. Encerro
lembrando a máxima de um velho militante de Pacajá: “governo é como galo velho,
só fica bom na pressão”.
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/node/12949
17/052013
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