Augusto Juncal
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Trabalhadores estão mobilizados em mais de 20
cidades em todo o Cabo Ocidental, começando a se organizar e a criar uma pauta
comum de causa e de luta entre todos os tipos de trabalho no campo.
A motivação para os protestos e mobilizações
dos trabalhadores e trabalhadoras agrícolas da África do Sul, que começaram em
novembro do ano passado, foi a onda de greves dos trabalhadores das minas de
Marikana, noroeste de Johanesburgo, da empresa Lonmin.
A paralisação foi
iniciada em agosto de 2012 pelos próprios trabalhadores (sem interferência do
seu sindicato), que reclamavam melhorias significativas de salário. Em
setembro, eles conquistaram um aumento salarial de 22%, depois de cinco semanas
de luta e apesar de a polícia truculenta e racista ter assassinado
estupidamente 34 mineiros e deixado um elevado número de feridos.
Os novos protestos começaram em Doorns e se
estenderam por diversas outras áreas da província de Cabo Ocidental, que
responde por 60% das exportações agrícolas do país. Já são mais de 12 mil
trabalhadores/as em greve. Para os grevistas, o levante de Doorns deve ser
visto como um momento importante.
A grande maioria deles trabalha nos vinhedos
perto dali, onde se produz uvas para exportação e para o vinho. São quase 8 mil
trabalhadores permanentes e outros 8 mil temporários, ganhando 70 rand (o
equivalente a oito dólares) de salário.
Eles exigem um salário mínimo de 150
rand (17,5 dólares) por dia, mas os fazendeiros capitalistas querem dar somente
80 rand. A luta é também pelo direito de comer o que produzem e para dar aos
filhos uma educação apropriada, entre outras demandas.
Mais que por uma questão meramente salarial, estão
lutando contra décadas de descontentamento com a extrema exploração e opressão
a que têm sido submetidos nas fazendas, nas pequenas cidades rurais e na
agricultura como um todo. Lutam por melhores salários e melhores condições de
trabalho.
Os protestos que se levantaram na província de Cabo
Ocidental podem estar representando um momento histórico na luta do povo
sul-africano. Trata-se de trabalhadores rompendo com as atuais condições de
vida e trabalho, exigindo uma transformação radical no campo sul-africano.
Trata-se de um levante espontâneo, com débil capacidade organizativa. Uma das
heranças do Apartheid é a dificuldade de organização dos trabalhadores,
produzida pelo duro controle do Estado nas áreas rurais.
Hoje a África do Sul tem mais ou menos 500 mil
trabalhadores rurais, sendo que a maior proporção deles – 121mil - trabalha na
província de Cabo Ocidental. No entanto, eles estão muito pouco organizados,
somente 3 a 5% fazem parte de alguma organização.
E, justamente nesta província
onde os protestos têm sido mais ferozes, existe uma maior organização, com a
presença de movimentos sociais, pequenas organizações e ONGs. Disso se
compreende que, apesar do fato de existir uma Constituição que garante o
direito à liberdade de expressão e associação, esses direitos são coibidos pela
intimidação e pelo medo.
Esses trabalhadores e trabalhadoras se deram conta
que, apesar das mudanças nas relações de trabalho que ocorrem desde 1994,
quando da "nova Africa do Sul" (livre do Apartheid), muito pouco
mudou nas fazendas. Este país ainda luta duramente contra esse legado político,
econômico e social.
As relações de trabalho ainda são uma continuidade do
antigo sistema. As violações massivas dos direitos humanos continuam. Os
direitos garantidos oficialmente são largamente ignorados pelos fazendeiros. E
o Departamento do Trabalho é ausente, incapaz e, às vezes, conivente com os
fazendeiros contra os trabalhadores.
O fato é que os trabalhadores estão mobilizados em
mais de 20 cidades em todo o Cabo Ocidental, começando a se organizar e a criar
uma pauta comum de causa e de luta entre todos os tipos de trabalho no campo.
Há quatro anos, na mesma cidade de Doorns, os trabalhadores estrangeiros (de
Zimbabue e Lesoto) sofreram ataques xenófobos por parte dos sul-africanos, que
os acusavam de tomar os seus empregos por trabalharem com salários mais baixos.
Agora, neste processo, os trabalhadores irmãos desses países foram incorporados
à luta e a participação deles tem fortalecido a greve.
Mas repete-se contra os trabalhadores agrícolas a
mesma violência usada contra os mineiros. Centenas de trabalhadores foram
presos e estão sendo acusados de praticarem atividades criminosas.
Em Citrusdal
(Cabo Ocidental), 18 trabalhadores/as foram levados a julgamento, acusados de
praticarem violência pública. Eles apenas marchavam pacificamente para entregar
um memorando com suas demandas de melhorias nas condições de trabalho, quando a
polícia os recebeu com tiros, dizendo que os trabalhadores primeiramente teriam
atirado pedras.
Também a marcha dos companheiros do Forum Citrusdal
de Trabalhadores Rurais, que dirigia-se à cidade de Clanwilliam para dar apoio
a dois companheiros e duas companheiras presos, foi parada pela polícia em
trajes militares, que não permitiu que eles entrassem na cidade sob alegação de
que praticariam atividades criminosas. Os quatro presos não tiveram direito à
fiança e não se sabe com clareza do que estão sendo acusados.
Mais do que uma luta de brancos contra negros, de
trabalhadores locais contra trabalhadores estrangeiros, o que se explicita com
tudo isso é a luta de classes: de uma que quer explorar e para isso precisa
oprimir, e de outra que quer conquistar a sua emancipação humana. No fundo,
seria mais apropriado dizer que são os capitalistas, casualmente com tez
branca, que exploram trabalhadores, casualmente com tez negra.
Razão tinha Steve Biko: "Esses complexos
tradicionais de inferior-superior branco-negro são criações deliberadas do
colonialismo". E eu complemento...do capitalismo em seu momento colonial e
de todo o desenvolvimento do capitalismo em seus diferentes estágios.
30/01/2013
Augusto Juncal é militante do Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
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