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quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Os arrozeiros representam o enclave da violência na reserva indígena Raposa Serra do Sol. Entrevista especial com Roberto Liebgott


O conflito entre grandes produtores de arroz e povos indígenas na região da Raposa Serra do Sol, no estado de Roraima, existe há décadas, mas intensificou-se nos últimos dias, com o crescimento nos trabalhos de retirada dos não-índios da região. “Os verdadeiros povos daquela área continuam vivendo numa situação de muita tensão porque tanto os políticos locais quanto os invasores da área articulam mobilizações e eventos que provocam as comunidades indígenas e promovem a violência”, afirmou Roberto Liebgott, em entrevista concedida por telefone à IHU (Instituto Humanitas Unisinos) On-Line.

Enquanto os índios querem ocupar o seu território de direito, os arrozeiros queimam pontes que dão acesso à região, promovem protestos e incendeiam propriedades daqueles. Tudo isso apoiado por políticos e pela elite do estado. “Há necessidade de uma ação urgente do governo para retirar esses arrozeiros e impedir que novas invasões sejam promovidas ou patrocinadas pelos políticos locais”, comentou Liebgott sobre o longo conflito.

Confira a entrevista.
 
 
Roberto Liebgott


IHU On-Line – Qual é a sua reflexão sobre a situação na Raposa Serra do Sol?

Roberto Liebgott – A área de Raposa Serra do Sol, embora tenha sido homologada pelo presidente da República, enfrenta uma situação de violência que permanece porque os ocupantes não-indígenas não foram retirados da área. Então, os verdadeiros povos daquela área continuam vivendo numa situação de muita tensão porque tanto os políticos locais quanto os invasores dela articulam mobilizações e eventos que provocam as comunidades indígenas e promovem a violência. Então, os índios hoje vivem uma situação muito complicada naquela área.

IHU On-Line – O que representa para os índios a permanência desses arrozeiros em sua região?

Roberto Liebgott – Representa o enclave da violência, porque eles foram, ao longo das últimas décadas, os principais promotores de conflitos internos, fomentando conflitos da própria sociedade local contra as comunidades indígenas. Ou seja, são verdadeiros enclaves que precisam ser retirados. Caso contrário, não vai haver avanço significativo algum com a demarcação da área.

IHU On-LineUm dos grandes arrozeiros inseridos nesse conflito é prefeito de uma das cidades da região. Ele prevê um conflito inevitável depois que o governo federal retirá-los da região. O conflito é inevitável mesmo?

Roberto Liebgott – O conflito está estabelecido há décadas na área. O que precisa haver é uma ação contundente da parte do governo federal, através do órgão indigenista e do próprio efetivo da Polícia Federal, no sentido de remover os invasores da área indígena. Não são mais muitos, porque grande parte dos invasores foi sendo retirada ou pelo Poder Público ou pela própria força que os índios exerceram. Então, há necessidade de uma ação urgente do governo para retirar esses arrozeiros e impedir que novas invasões sejam promovidas ou patrocinadas pelos políticos locais.

IHU On-LinePor que esses grandes arrozeiros querem tanto essa região dos índios?

Roberto Liebgott – Eles se instalaram ali e ali começaram a arrecadar lucros. Esses arrozeiros, em sua grande maioria, são oriundos de várias regiões, inclusive do Sul do Brasil, que foram para a região da Raposa da Serra do Sol, na perspectiva de colonização e de obtenção de lucro. Com isso, invadiram o território indígena e passaram a explorar este local. Eles nunca pagaram impostos, nunca pagaram nada porque historicamente aquela é uma área indígena. Então, eles exploram a terra, obtendo lucro às custas do direito dos povos indígenas.

IHU On-LineComo a situação de Raposa Serra do Sol chegou a este patamar?

Roberto Liebgott – Há muitas décadas, os povos indígenas lutam pela demarcação daquela área. Muitas lideranças deram a vida por aquele território. Então, não é uma história de luta de hoje e nem uma história de violência nova enfrentada pelos índios. Trata-se de um processo sistemático que vem se desenvolvendo há décadas, desde que os índios passaram a se organizar, se articular e reivindicar o seu território como território de direito tradicional. Assim, desde então, a pressão é muito forte e muito violenta.

IHU On-LineO que está acontecendo em Raposa Serra do Sol pode mostrar uma perda da soberania brasileira sobre a região?

Roberto Liebgott – Isso é uma outra falácia que as autoridades locais, os políticos e a elite da região tentam passar para a sociedade. Na verdade, o que é uma terra indígena? Uma terra indígena é propriedade da União. Então, na medida em que o governo demarca uma área, ela passa a ser propriedade exclusiva da União com usufrutos dos povos indígenas. Então, demarcar terras indígenas é assegurar que o patrimônio da União seja garantido, inclusive constitucionalmente.

IHU On-LineComo o governo deveria agir sobre este problema?

Roberto Liebgott – Primeiro, o governo deveria, por meio de suas forças, tanto do órgão indigenista quanto do ministério da justiça, articulado com a polícia federal, remover os invasores da terra indígena. Porque é uma área homologada com direitos exclusivos dos índios para sua ocupação, seu usufruto, e todos que estão sobre elas são considerados invasores. Além disso, seus títulos, que eles alegam possuir, também são caracterizados como nulos. Então, o governo deveria proceder imediatamente à retirada desses ocupantes do território indígena.

(www.ecodebate.com.br) entrevista publicada pelo IHU On-line, 03/04/2008 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

Roberto Liebgott é coordenador do Conselho Indigenista Missionário - CIMI - da Região Sul do Brasil.


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