Em 1978, centenas de indígenas e camponeses
criavam o Comité de Unidad Campesina (CUC); objetivo era construir a unidade
das diversas lutas camponesas que ocorriam no país.
indígenas e camponeses na Guatemala - Foto:Ricardo Busquets |
No Dia Internacional da Luta Camponesa (17 de
abril) desse ano, em frente ao Palácio Nacional na capital da Guatemala,
centenas de indígenas e camponeses celebraram os 35 anos do Comité de Unidad
Campesina (CUC). Embora a data do aniversário da organização seja 15 de Abril,
a data escolhida em solidariedade às lutas camponesas em todo o mundo, principalmente
para relembrar o Massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido no Brasil em 1996 e
exigir justiça e punição aos responsáveis.
Cabeça clara, coração solidário e punho
combativo
No dia 15 de Abril de 1978, camponeses indígenas
e mestiços da Guatemala criavam CUC. O objetivo era construir a unidade das
diversas lutas camponesas que ocorriam no país, como forma de avançar nas
demandas populares do campo e organizar a resistência camponesa frente as
violações de direitos humanos e massacres perpetrados pelo exército
guatemalteco.
Durante o surgimento do CUC, a Guatemala estava
em plena guerra civil, onde se enfrentavam o exército guatemalteco (financiado
e treinado pelos EUA e Israel) e as forças guerrilheiras do EGP (Ejército
Guerrillero de los Pobres), FAR (Fuerzas Armadas Revolucionarias), ORPA
(Organización del Pueblo en Armas) e PGT (Partido Guatemalteco del Trabajo). O
exército utilizava a Política de Terra Arrasada, com a estratégia de “tirar a
água do peixe”, ou seja, exterminar qualquer comunidade que apoiasse os
movimentos insurgentes.
A primeira aparição pública do CUC foi em 1º de
Maio de 1978. Milhares de camponeses e indígenas saíram às ruas do país
apresentando suas demandas, seus princípios e sua disposição de luta, com a
palavra de ordem “Cabeça Clara, Coração Solidário e Punho Combativo”.
Nos anos 80, quando todas as forças insurgentes
se unificaram e criaram a URNG (Unión Revolucionaria Nacional Guatemalteca), a
repressão e os massacres por parte do exército aumentaram, principalmente sob o
governo do general Ríos Montt.
Entre suas ações, o CUC organizou a Grande Greve
da Costa Sul, com mais de 80 mil trabalhadores paralisados, exigindo seus
direitos. É durante esse período que se dá o genocídio na Guatemala, com
centenas de comunidades exterminadas, mais de 250 mil assassinatos e mais de 1
milhão de pessoas expulsas de suas terras. O CUC foi uma organização central na
defesa dos diretos camponeses e indígenas, denunciando os massacres e
organizando a autodefesa das comunidades. E por causa dessa luta, foi
perseguido. Muitos dirigentes e militantes foram assassinados. Outros tiveram
que sair o país e viver no exílio.
Em 1985, desde uma reunião no México, o CUC se
reorganiza e se reestrutura frente a política genocídio do governo. Sai a público
outra vez em 1º de Maio de 1987, integrando suas bases a Unidad de Accíon
Sindical y Popular (UASP). As principais demandas são devolução das terras
roubadas pelos militares, a desmilitarização das comunidades, o fim o
recrutamento forçado de jovens e crianças e a dissolução das Patrullas de
Autodefensa Civil (PAC).
Anos 90 e a perspectiva da paz
No início década de 90, o CUC participa
ativamente na Campanha Continental “500 Anos de Resistência Indígena, Negra e
Popular”. Participa também da criação da Via Campesina e da Coordenadora
Latinoamericana de Organizações do Campo (CLOC).
Em nível nacional, o CUC contribuiu para o
surgimento de outras organizações camponesas, indígenas, de mulheres, de
desalojados, etc. Também contribuiu para criação de diversas coordenações, como
Majawil Q´ij, COPMAGUA, Nukuj Ajpop e CNOC, fortalecendo a unidade das lutas
populares guatemaltecas.
Participou dos debates das negociações de paz,
através da Assembleia da Sociedade Civil, construindo propostas de uma
institucionalidade que ajudasse a concretizar os acordos de identidade e
direitos dos povos indígenas e a solucionar a situação agrária criada pelos 500
anos de colonização e pela guerra. Em 1996, são firmados os Acordos de Paz na
Guatemala, pondo fim a 36 anos de guerra civil.
Porém, com a assinatura do Tratado de Livre
Comércio (TLC) com os EUA, em abril de 2005, as medidas que poderiam solucionar
os problemas indígenas e camponeses previstas pelos Acordos de Paz são
abandonadas pelos governos.
A luta continua
Desde que o ex-general Otto Pérez Molina assumiu
a presidência da Guatemala, em janeiro de 2012, um grupo de militares ligados à
repressão dos anos 80 ocupam importantes postos no governo. O próprio Pérez
Molina é acusado de ser um dos responsáveis pelos Massacres em Nejab. Neste
contexto, o CUC vem sendo alvo de inúmeras perseguições. O processo de
criminalização e repressão atualmente tem o CUC como principal alvo. Os
assassinatos e sequestro de líderes populares aumenta dia após dia.
Mesmo diante desse quadro, o CUC segue em sua
luta contra os megaprojetos de mineração e a expansão do agronegócio na
Guatemala, que afeta centenas de comunidades e milhares de indígenas e
camponeses. A teimosia e a rebeldia do CUC segue assustando a classe dominante
guatemalteca, com suas ocupações, bloqueios de rodovias e denúncias frente ao
atual modelo econômico da Guatemala.
A história do CUC se mescla com a história do
povo guatemalteco. Os milhões de indígenas maias da Guatemala (Kaqchikeles,
Tz'utujiles, Pocomames, Ch'orti'es, Uspantekos, Sipakapenses, K'iche's, Mames,
Chuj's, Akatecos, Awacatecos, Sakapultecos, Chalchitecos, K'eekchies,
K'anjob'ales, Ixiles, Achi'es, Tektiteko e outros) somam-se aos Xincas,
Garífunas e mestiços nas lutas populares. E o CUC segue sendo uma referência
para essas e outras lutas na Guatemala.
Em seus 35 anos, o CUC representa a resistência,
a luta e as conquistas dos povos da Guatemala. Mas ainda há muito o que fazer
diante do objetivo principal do CUC: "Arrancar de raíz la injusticia y el
sistema opresor".
Mais sobre o assunto:
Fonte:http://www.brasildefato.com.br/node/12756
25/04/2013
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