Sem medo de assumir a frente do Movimento dos Sem
Terra em um Estado que eles são mortos pelos fazendeiros, Maria Raimunda segue
em frente.
Ismael
Machado, Diário do Pará / Agência Pública
A frase foi dita em uma reunião entre
latifundiários de Marabá, a 685 quilômetros de Belém: para enfraquecer o
movimento dos Sem Terra no sudoeste do Pará bastava tirar quatro pessoas do
caminho. Uma delas era Maria Raimunda César de Souza.
Maria Raimunda não ficou surpresa ao ouvir o
veredito dos fazendeiros dias depois da reunião. Aos 39 anos, já foi ameaçada
de morte e teve a prisão decretada em algumas ocasiões e sabe que é uma pedra
no sapato deles. Afinal, ela é a diretora nacional do MST no Pará.
Em 2008 recebeu de um amigo um recado era para se
afastar de ações no município vizinho de Parauapebas. Um policial militar havia
sido sondado para executar Maria Raimunda e outras três lideranças do MST na
região. O policial a conhecia e não topou a empreitada. Pediu para avisá-la do
risco que corria.
Viver sob esse tipo de tensão não é novidade para
Maria Raimunda. Ela nasceu em Marabá, mas cresceu em Brejo Grande do Araguaia,
a 100 km de Marabá. Era o auge da Guerrilha do Araguaia e a cidadezinha vivia
com medo. “Quem mandava era o Exército. Toda a cidade era vigiada. Todos tinham
que dormir em esconderijos subterrâneos por causa dos ataques de bomba. Eu fui
crescendo nesse ambiente”, lembra.
No auge do conflito, a casa de farinha no quintal
da casa em que morava com os pais foi escolhida pelo Exército para servir de
alojamento aos soldados. Com o fim dos combates a residência passou a ser apoio
de padres e freiras, principalmente dominicanos. O temido major Curió era
presença constante em Brejo Grande do Araguaia. Junto aos ex-guias do Exército
durante a campanha de combates aos guerrilheiros, Sebastião Curió impunha o
terror.
Maria Raimunda |
“Minha opção de vida foi escolher entre o medo de
calar e a defesa dos direitos humanos. Optei pela segunda via”, diz Maria
Raimunda. A decisão veio cedo. Com menos de 12 anos, na primeira metade dos
anos 80, já participava das comunidades eclesiais de base da igreja católica.
Acompanhou marchas e mobilizações num período em que os crimes de pistolagem e
a luta pela posse da terra atingiram o ápice no sul e sudeste do Pará.
Em 1993, Maria Raimunda mudou para Marabá para
cursar Letras na Universidade Federal do Pará. Um ano depois ingressou no
Diretório Central dos Estudantes (DCE). Era uma época de embates entre o MST e
os latifundiários. Em Parauapebas, a fazenda Palmares era uma das primeiras
ocupações em que o MST e as milícias organizadas pelos fazendeiros se
enfrentaram. “Dávamos apoio a essas manifestações e aos poucos fui conhecendo o
pessoal que fazia parte do movimento”.
Em 1996 ocorreu o massacre de Eldorado dos Carajás.
Sangue, retaliações, violências. Maria Raimunda sentia que havia algo se
modificando dentro dela e na situação agrária do Pará. Em 1998 ingressou no MST
e, de cara foi enviada a Belém para atuar no escritório político da
organização. Ficou seis anos em Belém. Acompanhou de perto as tensões
envolvendo os assentamentos João Batista, em Castanhal, distante a duas horas de
carro de Belém e as diversas ações de despejo e resistência do assentamento
Mártires de Abril, no distrito do Mosqueiro. Tornou-se forte, acostumada à
tensão e à resistência.
“Em Marabá ficou mais pesado. As ameaças são mais
fortes. E é uma ameaça a toda luta. Os fazendeiros ‘fazem o serviço’. Eles
querem ver o sangue derramar. Várias vezes recebi avisos de que poderia morrer.
Muitas mensagens, gente dizendo para me cuidar, não viajar à noite, evitar
ônibus, barzinhos, a não me expor”. Às vezes o telefone toca e do outro lado,
só o silêncio ou uma respiração profunda. Pressão psicológica.
E há a pressão oficial. Desde 2006 Maria Raimunda
assumiu a direção do MST. Todos os processos de ocupação de terra, todos os
embates e confrontos com a polícia, fazendeiros ou mesmo com a Justiça, têm o
nome dela à frente. Por conta disso, já teve pelo menos três prisões
decretadas. “Tive de passar três meses foragida, de canto em canto, com a minha
prisão preventiva decretada na região.
A última foi no governo petista de Ana Júlia
Carepa, depois do fechamento de pista na Curva do S, local do massacre de
Eldorado dos Carajás, em protesto contra as milícias armadas nas fazendas do
controverso banqueiro Daniel Dantas, espalhadas pelo sudeste do Pará.
Mas ela diz que sente ainda mais medo quando a
situação parece mais tranquila. “Quando baixa a poeira dessas tensões é
que eu tenho mais medo. É na calmaria que os pistoleiros agem mais, quando
estamos de guarda baixa. Mas o que a gente pode fazer? Não dá para parar a vida,
deixar de viver. Tem que seguir em frente e é isso que eu faço”.
29/07/2013
Foto: Edinaldo Souza
Tanbem sou um morador e representante do MST aqui do entorno de Brasília DF .e Tanbem fui martirizado por representar a luta militante.
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